Deputados do PSD estão contra as propostas socialistas de alteração ao regimento da Assembleia da República, sobretudo, a que retira a possibilidade de pergunta-resposta nos debates com governo. Na resposta, PS ironiza, mas mostra abertura para diálogo.
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Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades e, claro, também as maiorias. Já se sabia que com a mudança de líder no PSD havia uma vontade de trazer de volta os debates quinzenais, agora, os mesmos deputados que na legislatura passada aprovaram uma alteração ao regimento para espaçar os debates, vêm agora aos passos perdidos defender o contrário e com acusações ao PS.
O deputado Hugo Carneiro é claro a apontar o dedo: "Aquilo que a proposta do PS visa é tornar o parlamento num centro de congressos". Em causa está, sobretudo, uma proposta de alteração ao regimento da Assembleia da República (AR), por parte do PS, que, ainda que aceda ao regresso dos debates quinzenais, prevê acabar com o modelo pergunta-resposta ao primeiro-ministro.
Na proposta socialista, lê-se que "no final do tempo de intervenção de cada partido segue-se, de imediato, a resposta do Governo", não permitindo "o pingue-pongue" que atualmente está em vigor.
No entanto, os deputados do PSD, quando questionados se se arrependem das alterações feitas no passado, são taxativos. "A realidade que temos hoje é totalmente diferente, esta não é uma questão de arrependimento porque a realidade é totalmente diferente", vinca Hugo Carneiro.
Até porque, lembra Duarte Pacheco, está em causa o "uso da maioria absoluta que está a ser utilizada como rolo compressor".
Resta a pergunta se não se trata de arrependimento, se se tratou de alguma ingenuidade social-democrata no passado?
"Como parlamentar, acredito no bom senso, mas às vezes ele não existe. Não é pelo facto de ele às vezes não existir que devemos andar sempre de pé atrás e com receio de qualquer tipo de ataque à democracia. Mas, infelizmente, a prática recente dos últimos três meses, o chumbo de protagonistas como o ministro das Obras Públicas, do presidente da Câmara de Setúbal, só para dar dois exemplos, evidencia que estamos com uma maioria que quer, pode e manda no parlamento", responde Duarte Pacheco notando que esta proposta de alteração socialista quer reforçar esse "poder absoluto e evitar todo o escrutínio por parte da Assembleia da República".
Traduzindo, Duarte Pacheco confiou no passado que no futuro aquele que considera bom senso iria imperar, não se tendo tratado de ingenuidade da parte do PSD de 2020.
PS aberto ao diálogo (mas com farpas ao PSD)
Depois da conferência de imprensa do PSD, o PS sentiu necessidade de dar resposta no imediato manifestando total abertura para diálogos e consensos no que toca à revisão do regimento.
"O PS gostava de reiterar a disponibilidade completa que mantém para encontrar soluções consensuais em matéria de regimento da AR. Assim o fizemos no passado, aliás, a versão em vigor resulta de um acordo entre PS e PSD", começa por realçar o deputado que nota ainda que é "precisamente nos aspetos em que o reforço de escrutínio parlamentar se afiguram mais necessárias, que o PS apresentou a sua proposta de revisão do regimento que duplica as presenças dos ministros e do primeiro-ministro nos debates parlamentares".
No entanto, o vice-presidente da bancada socialista não perde a oportunidade para ironizar e afirma: "é um bocadinho difícil fazer uma discussão regimental quando as pessoas com quem procuramos estabelecer as pontes e os consensos vão mudando de ideias consoante os dias da semana também vão mudando".
"Sei que é um dia quente e, eventualmente, um dia quente pode gerar produtos diferentes dos dias frios, mas mantemos a nossa cabeça fria e mantemos a intenção de continuar abertos ao diálogo e continuar abertos a encontrar soluções que reforcem e continuam a alargar a forma como o parlamento escrutina todo o governo", destaca Delgado Alves.
Sobre o ponto mais vincado pelo PSD, Pedro Delgado Alves mantém a defesa do seu projeto, ainda que não negue que possam existir negociações sobre ele. Ainda assim, o deputado nota que o modelo proposto pelo PS prevê a "possibilidade de as intervenções terem algum conteúdo e poder haver conteúdo nas respostas que são dadas".
"Parece-nos que é muito diferente o espírito de uma comissão parlamentar à qual os ministros vão com regularidade, em que a grelha é maior, em que está disponível para uma audição que demora, muitas vezes, várias horas e que é extensa, do que um debate em que, fundamentalmente, as pessoas querem ver esclarecidas as questões de atualidade daquela quinzena e daquele período de tempo", realça.
Em jeito de conclusão, Delgado Alves nota que "a lógica de pingue-pongue é boa para os jogos olímpicos e não é necessariamente a melhor para um debate parlamentar".
Os trabalhos de revisão do regimento, de resto, começam esta quarta-feira em comissão parlamentar, não se avizinhando um consenso alargado como aconteceu em 2020 quando PS e PSD foram os protagonistas das principais alterações que ditaram o final dos debates quinzenais com o primeiro-ministro.