Trabalham e não tiveram quebra de rendimento. Deco recebe 20 mil pedidos de ajuda até setembro
À TSF, Natália Nunes refere que, apesar de não terem tido uma perda de rendimentos, as famílias "estão com muitas dificuldades em honrar os compromissos, nomeadamente com a habitação".
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A maioria dos mais de 20 mil pedido de ajuda que chegaram à Deco até setembro vêm de pessoas que trabalham e não tiveram quebra de rendimento, mas entraram em dificuldade financeira devido à subida dos preços e juros.
À TSF, Natália Nunes explica que cada vez há mais pedidos de ajuda devido ao aumento do custo de vida.
"Mais de 60% das famílias que nos pede ajuda está a trabalhar, portanto, não tiveram uma perda de rendimentos. No entanto, estão com muitas dificuldades em honrar os compromissos, nomeadamente com a habitação. Isto tem muito a ver com o momento que nós vivemos atualmente por causa da inflação elevada que afeta o orçamento das famílias, mas também com a subida das taxas de juro", argumenta Natália Nunes.
Por outro lado, a Deco reconhece que "são famílias que, neste momento, já não têm qualquer poupança". "Muitas delas até conseguiram fazer poupança durante a pandemia, mas a verdade é que no ano passado e neste ano acabaram por gastar toda a poupança que tinham conseguido fazer. No Dia Mundial da Poupança, a Deco não podia deixar de vir alertar para a necessidade de todos fazermos poupança, nomeadamente a poupança para os imprevistos", sublinha.
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Assinala-se, esta terça-feira, o Dia Mundial da Poupança. Natália Nunes alerta para os apoios ao crédito à habitação, que excluem os agregados familiares com poupanças a rondar os 30 mil euros. A jurista da Deco pede ao Governo que não discrimine as famílias com poupanças.
"A questão da poupança continua a ser um fator de exclusão das famílias, colocando-as em pé de desigualdade só pelo facto de terem uma poupança e, neste momento, aquilo que entendemos é que o próprio Estado também deveria dar sinais às famílias da necessidade de terem uma poupança", defende a Deco.
Natália Nunes entende que a poupança "não deveria ser um dos requisitos para as excluir as famílias do apoio à bonificação". "Não compreendemos que haja o requisito de não ter poupanças para ter acesso a esta medida."
Natália Nunes reafirma que os apoios para quem tem crédito à habitação são muito limitados.
"As medidas que existem para quem tem crédito à habitação é a bonificação, que é verdadeiramente um apoio para as famílias, e a outra medida que as famílias vão poder requerer a partir de 2 de novembro é a possibilidade de fixarem a prestação. Este caso não é um verdadeiro apoio, é uma medida que permite que alguma liquidez às famílias, mas as famílias têm que estar conscientes que aquilo que não pagarem agora vão pagar mais tarde, o que significa que, em bom rigor, o único apoio que as famílias têm em matéria de crédito à habitação é a bonificação dos juros, que no máximo pode ir até aos 800 euros, mas que não terão acesso as famílias que tenham poupanças", acrescenta.
"Aumento da taxa de poupança pode não traduzir verdadeiro significado da maior disponibilidade financeira"
Os dados mostram que a poupança em Portugal está a aumentar, mas António Ribeiro, economista da Deco Proteste, tem dúvidas quanto à verdadeira explicação desse crescimento do aforro dos portugueses.
"Não são os portugueses que estão a dedicar mais à poupança. A taxa de poupança é o montante da poupança sobre o rendimento disponível. O que nós verificamos nos dados do INE é que aumentaram os dois aspetos, tanto o montante da poupança como o montante do rendimento disponível, portanto, poderá ser a questão das ajudas financeiras do Estado que está aqui a criar algum artifício e gera um aumento da taxa de poupança, que pode não traduzir um verdadeiro significado da maior disponibilidade financeira dos portugueses", esclarece António Ribeiro, em declarações à TSF.
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A Deco Proteste considera ainda que o Estado não tem valorizado a poupança como devia. Por isso, António Ribeiro deixa uma proposta.
"Claro que para os vários governos é muito mais interessante incentivar o consumo, mas ao ignorarmos a poupança as famílias deixam de ter uma almofada financeira para eventuais crises. Nos últimos dias, apresentámos um conjunto de medidas para o Governo incentivar os portugueses a pouparem", refere, dando um exemplo: "Baixar a taxa de imposto dos produtos de poupança."
"Neste momento em Portugal, por exemplo, no rendimento dos depósitos é cobrado 28% de imposto. Em Espanha, essa taxa é de 19%, ou seja, é quase menos 10 pontos percentuais", argumenta.
Esta situação leva a responsável do Gabinete de Proteção Financeira (GPF) da Deco, Natália Nunes, a alertar para a cada vez maior importância de as pessoas constituírem um fundo de emergência, para o qual devem canalizar o que consigam poupar, considerando que este objetivo deve ser uma "prioridade".
"Agora, a preocupação relativamente ao fundo de emergência ainda se coloca com mais pressão porque não sabemos o que é que 2024 nos vai trazer", sublinha Natália Nunes, em declarações à Lusa, a propósito do Dia Mundial da Poupança.
"É verdade que os incentivos à poupança praticamente não existem" e que "os desafios [para poupar] são enormes", mas "para evitar ruturas" e "situações de desequilíbrio orçamental" devido ao aumento do custo de vida ou taxas de juros, "é fundamental termos um fundo de emergência", precisa.
A coordenadora do GPF refere que, entre janeiro e até ao final de setembro, chegaram cerca de 20 mil pedidos de ajuda por parte de famílias que começam a ter dificuldades em lidar com todas as despesas mensais, sendo que, salienta, "a principal razão que leva as famílias a pedir ajuda este ano está muito centrada na questão do aumento do custo de vida provocado pela inflação e pelo aumento das taxas de juros".
"Temos verificado que mais de 60% das famílias [que nos pedem ajuda] estão a trabalhar, não tiveram alteração dos seus rendimentos, foi sim a subida das taxas de juros, do aumento do custo de vida que as leva precisamente a esta situação", refere, notando que o número de pedidos é semelhante ao de anos anteriores (marcados pelo impacto da pandemia e da guerra), mas os motivos são agora diferentes.
Natália Nunes exemplifica com um dos muitos casos que lhe chegam diariamente por mail, este de uma pessoa que vive sozinha, que tem um rendimento líquido de 1.000 euros mensais e que entrou em outubro sem margem para pagar a prestação do empréstimo da casa, que subiu para os 737 euros este mês -- valor que compara com os 378 euros que pagou até 2022 ou com os 491 euros que pagou até setembro.
Exemplos que levam a coordenadora do Gabinete de Proteção Financeira da Deco a insistir na necessidade de se fazer alguma poupança com base naquilo que cada um conseguir poupar, por pouco que seja, e depois de alguma análise das despesas para verificar se e onde podem ser cortadas, a par da prática de poupanças de água, energia, nos pacotes de seguros e telecomunicações ou no supermercado -- onde entrar com uma lista de compras pode ser uma forma de evitar gastos supérfluos.
"Aquilo que é desejável é que as famílias estabeleçam o objetivo de ter uma poupança e vão todos os meses fazendo esta poupança para conseguirem atingir este objetivo", refere Natália Nunes, salientando que, apesar dos juros serem baixos, o depósito a prazo (pela facilidade de movimentação que normalmente tem) pode ser uma boa opção para 'guardar' este 'pé de meia'.
Entretanto, para assinalar este Dia Mundial da Poupança, no site da Deco foi criado um espaço chamado "Sobreviver à crise", com pequenos vídeos e textos sobre finanças pessoais e dicas de poupança, entre outros materiais.
* Notícia atualizada às 12h13