Um pesadelo para a aviação. Decisão de Trump pode afetar mais de 17 mil voos
Os europeus estão proibidos de viajar para os EUA, mas os cidadãos norte-americanos podem regressar ao país. Um imbróglio logístico que mais de 40 companhias aéreas, com milhões de passageiros, terão de resolver.
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A decisão dos Estados Unidos de suspender durante 30 dias todos os voos oriundos de países da União Europeia promete ser mais um golpe duro no setor da Avião Civil, que até agora estima um impacto de 110 mil milhões de dólares (cerca de 98 mil milhões de euros), associado ao Covid-19, segundo a previsão da Associação Internacional dos Transportes Aéreos (IATA).
No entanto, nem todos os voos serão cancelados. Donald Trump decidiu abrir uma exceção ao Reino Unido e permitir aos cidadãos norte-americanos que pretendam regressar ao país.
Atualmente há 40 companhias aéreas europeias a voar para os Estados Unidos, num total de mais 560 voos por dia e 160.000 lugares. Isso significa que até 13 de abril poderá haver mais de 17 mil voos com 4.8 milhões de lugares cancelados.
A American Airlines, a Delta Air Lines e a United Airlines serão as mais afetadas, uma vez que juntas somam mais de 200 voos diários de e para os EUA, estima a analista de dados dedicada à aviação Cirium. Segue-se a alemã Lufthansa (em média 40 voos) e a Air France (37 voos).
A TAP já cancelou mais de mil voos desde o início do surto do novo coronavírus e previa cancelar mais 3500 nos próximos meses (o equivalente a 7% dos voos programados em março, 11% em abril e 19% em maio. E não deve ficar por aqui. Com 49 voos semanais para os Estados Unidos, para as cidades de Chicago, Miami, Boston, Nova Iorque, São Francisco e Washington, é previsível a suspensão de até 196 voos até dia 13 de abril.
Face à expectável falta de trabalho, a transportadora já veio pedir aos seus funcionários que usufruam "com caráter mandatário e prioritário" de dias de férias não gozados no ano passado.
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Já a SATA voa para Boston três vezes por semana, com partidas de Ponta Delgada e Lisboa, e promete continuar a fazê-lo:"A Azores Airlines mantém a operação aérea planeada (e até determinação em contrário) uma vez que a proclamação emitida pelos EUA, não resultou na proibição de realização de voos para o território americano, mas na restrição de entrada de passageiros provenientes de países com transmissão comunitária ativa do Corona Vírus COVID 19", esclarece a transportadora em comunicado.
Tenho voo para os EUA. E agora?
Questionada pela TSF, a TAP não especifica quantos voos espera manter e quais terá de cancelar. Garante apenas que "manterá os seus clientes informados acerca dos seus voos". Os passageiros podem consultar a situação do seu voo específico aqui.
Em comunicado, a transportadora garante que será possível fazer uma alteração das datas e destinos de todas as viagens compradas ou por comprar sem qualquer penalização.
No caso de viagens reservadas antes de 8 de março e para voos com partida até 31 de maio, os passageiros podem alterar a sua viagem e até o destino, para novo voo a ser feito até ao prazo alargado de 31 de dezembro, sem pagamento de qualquer taxa de alteração.
Também para as viagens cujas reservas forem efetuadas entre 8 e 31 de março, há a possibilidade de reagendamento do voo sem o pagamento da taxa de alteração associada.
Para facilitar as comunicações, e até porque tempos de resposta do atendimento ao cliente serão expectavelmente superiores ao normal, TAP pede aos seus clientes que atualizem os contatos no seu perfil em flytap.com.
Em resposta à TSF, fonte oficial da NAV (Navegação Aérea de Portugal) não confirma quantos voos com partida ou chegada dos aeroportos portugueses vão ser afetados. Diz apenas que "está a acompanhar os desenvolvimentos relativamente aos voos de/para EUA" e remete mais esclarecimentos para as companhias aéreas.
O que faz a TAP para assegurar uma viagem em segurança?
Em declarações à TSF, Anabela Jorge, diretora da unidade de cuidados de saúde da TAP, garante a transportadora está acompanhar a evolução da pandemia, ajustando o seu plano de contingência, mas diz que não está, para já, previsto um agravamento das medidas de prevenção a bordo dos aviões.
"A própria aviação e as autoridades sanitárias exigem uma série de procedimentos e materiais a bordo para fazermos face a qualquer contingência em qualquer momento. Já desde o início de janeiro houve uma série de procedimentos que foram reforçados", explica a responsável da companhia aérea.
Tal como já era regra nos aviões da TAP, se a tripulação identificar um passageiro doente este receberá uma máscara e, se possível, será retirado do lugar e encaminhado para uma fila de assentos com menor ocupação.
"Claro que há voos que isso não seja possível fazer", assume. E se o doente em causa estiver com dificuldades respiratórias pode ser necessário distribuir máscaras aos outros passageiros, pelo que foi reforçado o número de máscaras disponíveis nos kits médicos a bordo.
Foi também reforçado o stock de líquido desinfetante para a tripulação e haverá toalhitas de limpeza que podem ser disponibilizadas aos passageiros. É permitido o transporte de desinfetante para as mãos à base de álcool como bagagem de mão, com limite de 100ml por cada artigo líquido ou gel.
Caso exista a bordo um doente suspeito de estar contagiado com o novo coronavírus, o caso será comunicado ao supervisor do aeroporto, que por sua vez terá de contactar a autoridade sanitária local.
Se a suspeição for validada, o passageiro é encaminhado para o hospital e a partir daí os procedimentos são seguidos como se se tratasse de um caso confirmado de contágio, explica Anabela Jorge: É feita limpeza e recolhidos os contactos de todos os passageiros que estavam sentados ao lado, duas filas à frente e duas filas atrás do passageiros suspeito. Receberão mais tarde orientações das autoridades de saúde.
Não está, por isso, previsto que a TAP estabeleça a regra de deixar um assento livre entre cada passageiro, medida já adotada por outras companhias aéreas. "Quando temos voos que não estão completamente cheios isso é possível fazer", nota a diretora da unidade cuidados de saúde da TAP.
A tripulação sabe como agir perante todos os cenários, assegura a responsável. "Todas as pessoas em contacto com o avião recebem indicações específicas" sobre todos os procedimentos e logística a adotar durante a duração da pandemia.
Voar ou não?
Não há uma resposta certa, a decisão cabe a cada um, defendem os especialistas. A recomendação do Governo é para ficar em casa, mas não impõe o fecho de fronteiras. Nesta, tal como em crises anteriores, a Organização Mundial de Saúde (OMS) não recomenda a restrição de viagens e é isso mesmo que reitera na última diretiva sobre o assunto, divulgada no dia 27 de fevereiro.
"Tudo indica que restringir o movimento de pessoas e bens durante uma emergência de saúde pública é ineficiente na maioria das situações (...) Banir viagens para áreas afetadas ou negar a entrada de passageiros de áreas afetadas não é habitualmente eficaz na prevenção da importação de casos mas pode ter um grande impacto económico e social."
"Medidas que interferem significativamente com o tráfego aéreo podem apenas ser justificadas no início de um surto, já que permitem aos países ganhar tempo, mesmo que apenas alguns dias para implementar rapidamente medidas de preparação."
A caracterização do Covid-19 como uma pandemia não altera as diretivas da OMS quanto à prevenção, ressalvou a organização esta quarta-feira. Além disso, "vários países que negaram entrada a passageiros ou que suspenderam voos de e para a China e outros países afetados estão agora a reportar casos confirmados de Covid-19", reforça a organização.
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Por outro lado, a OMS aconselha todos os viajantes doentes, com qualquer patologia, a adiar ou evitar viagens para áreas afetadas, em particular no caso de pessoas idosas ou com com problemas de saúde crónicos.
Acrescem recomendações de etiqueta de higiene - lavar as mãos adequadamente e com frequência; evitar tocar no nariz e boca; manter uma distância de pelo menos um metro de pessoas com sintomas; tossir e espirrar para o braço em vez de usar as mãos.
Os viajantes que regressem ao país de origem provenientes de áreas afetadas devem ainda cumprir um período de quarentena voluntário e estar atento a eventuais sintomas durante 14 dias, o período máximo de incubação do vírus.
Quando a SIDA comprometia viagens
Esta é a primeira vez que os Estados Unidos suspendem voos como medida preventiva para tentar conter a propagação de uma epidemia. Com uma exceção.
Segundo a CNN, apenas em 1987 houve restrições de viagens associadas ao medo de uma doença: O presidente Ronald Reagan proibiu todos os portadores de HIV/SIDA de entrar nos Estados Unidos. Só mais de 20 anos depois, em 2009, a restrição foi levantada por Barack Obama.
Nem os surtos da SARS e da MERS, a Síndrome Respiratória Aguda Grave que provocou pneumonias atípicas entre 2002 e 2003 e a Síndrome Respiratória do Médio Oriente que atingiu o mundo em 2012, motivaram este tipo de medidas.
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O presidente dos Estados Unidos da América anunciou esta quarta-feira a suspensão de todos os voos oriundos de países da União Europeia para prevenir a propagação do novo coronavírus a partir desta sexta-feira e pelo menos durante 30 dias, uma decisão já condenada pela União Europeia.
Donald Trump fez o anúncio durante um raro discurso na Sala Oval dirigido à nação, depois de vários dias em que procurou minimizar a ameaça, culpando a Europa por não agir com rapidez suficiente para lidar com o novo coronavírus e alegando que os casos registados nos EUA foram "semeados" por viajantes europeus.
As Autoridades da Segurança Interna esclareceram mais tarde que as novas restrições de viagens se aplicariam apenas à maioria dos estrangeiros que estiveram no Espaço Schengen 14 dias antes da chegada programada aos Estados Unidos.
Os países signatários do Acordo de Shengen, a partir do qual os territórios permitem a livre circulação de pessoas, são os seguintes: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Eslováquia, Eslovénia, Espanha, Estónia, França, Finlândia, Grécia, Hungria, Islândia, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Liechtenstein, Malta, Noruega, Holanda, Polónia, Portugal, República Checa, Suécia e Suíça.
