Cartel na banca ainda pode existir

Receio, lido pela TSF, é expresso pela Autoridade da Concorrência na decisão que condenou 14 bancos a multa recorde por trocas ilegais de informações sensíveis entre 2002 e 2013.

A Autoridade da Concorrência (AdC) admite que nada garante que a grande maioria dos 14 bancos multados com uma coima recorde no caso conhecido como o cartel da banca, na concessão de créditos à habitação, ao consumo e às empresas, tenha acabado com as práticas proibidas que levaram à condenação.

A afirmação está na parte em que na decisão final sobre a investigação, que demorou sete anos a ser concluída, a autoridade responsável por garantir o cumprimento das leis da concorrência explica os critérios que levaram a aplicar uma multa nunca vista em Portugal por violações dessas mesmas regras, num total de 225 milhões de euros.

Nada demonstra que algo mudou

O documento consultado pela TSF diz que, à exceção dos bancos que pediram dispensa ou redução de coima, não há nos autos nenhum elemento que demonstre que os restantes - ou seja, a larga maioria - fizeram algo para eliminar as práticas proibidas.

Além disso, também nada revela que os bancos tenham procurado reparar os prejuízos causados à concorrência e, dessa forma, por consequência, aos consumidores.

Os factos anteriores foram, na prática, agravantes que levaram a decisão a aplicar multas mais pesadas.

O documento sobre o cartel tem 936 páginas e refere-se a um período de mais de dez anos, entre 2002 e 2013, mas essa mesma decisão final, que levanta na prática dúvidas sobre a continuação das práticas proibidas, tem data de 9 de setembro de 2019.

Caso andará muitos anos nos tribunais

A generalidade dos bancos já anunciou recursos para o Tribunal da Concorrência, pelo que o caso está longe de transitar em julgado.

Os bancos condenados são o BBVA, o BIC (por factos praticados pelo então BPN), o BPI, o BCP, o BES, o BANIF, o Barclays, a CGD, a Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo (CCCAM), o Montepio, o Santander (por factos por si praticados e por factos praticados pelo Banco Popular), o Deutsche Bank e a UCI.

O Barclays (que denunciou inicialmente o cartel) e o Montepio (que colaborou com a AdC, confirmando que participou em troca de informação sensível entre concorrentes) pediram dispensa ou redução da coima.

Bancos negam que informações trocadas fossem proibidas

A generalidade dos bancos tem contestado a condenação da AdC. Um dos argumentos é que as práticas, alegadamente ilegais, não significam, para os bancos, qualquer ilegalidade.

Por exemplo, no caso da CGD, como em relação a todos os outros bancos, a AdC defende que a informação partilhada entre concorrentes era sensível e reservada, sendo que em alguns casos nem era do conhecimento do Banco de Portugal ou dizia respeito a intenções futuras de descida dos seus 'spreads' (o preço a que emprestam o dinheiro).

No entanto, um dos argumentos do banco público é que "a informação, alegadamente trocada, deve ser considerada histórica e pública", não-comercialmente sensível, além de que "não é possível estabelecer a autoria material dos documentos" criticados pela AdC.

Outros bancos, como o Santander ou o Montepio, apresentam o argumento de que a informação censurada (ou pelo menos parte dela) é pública.

Entre vários outros argumentos enviados à Autoridade nas respostas que se podem ler na decisão final, o BCP contesta ainda a relevância dos documentos apreendidos e o BPI alega que desconhece a origem de certos documentos com as referidas informações sensíveis e proibidas.

O Deutsche Bank também considera, a determinada altura, "não ter tido consciência de que estava a partilhar informação sensível, na medida em que só partilhou informação pública".

A Autoridade da Concorrência tem sublinhado que a sua atuação já foi "sujeita ao escrutínio e validação permanente dos Tribunais, o que se traduziu na interposição de 43 recursos judiciais (incluindo para o Tribunal da Relação de Lisboa e para o Tribunal Constitucional), em relação aos quais somente cinco decisões lhe foram desfavoráveis".

O anúncio da condenação de 14 bancos a uma coima de 225 milhões de euros por terem participado naquele que ficou conhecido como o cartel da banca foi feito em setembro pela AdC. No entanto, só agora é possível conhecer todos os fundamentos numa decisão completa que a TSF tem consultado e analisado.

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