Não cabe ao Governo restringir direitos de deslocação aos idosos, mas garantir que estes permanecem em segurança, É o que defende o constitucionalista Jorge Reis Novais, mas Bacelar Gouveia tem mais reservas em apontar a inconstitucionalidade do presente decreto.
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"Inconstitucionalidades ostensivas." É assim que o professor constitucionalista Jorge Reis Novais classifica as restrições assimétricas ao direito de deslocação, aplicadas aos mais idosos na renovação do Estado de Emergência.
Na perspetiva de Jorge Reis Novais, estes limites não são compatíveis com a lei fundamental, já que "levantam algumas dúvidas de constitucionalidade e até alguma certeza de que são inconstitucionais".
"Em relação a essa possibilidade de assimetrias, de diferenciar população mais idosa, é verdade que o primeiro-ministro tem dito desde o início que os idosos têm um dever especial de recolhimento. Isso já é uma interpretação do ponto de vista jurídico, ou uma distorção do regime constitucional."
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Jorge Reis Novais explica à TSF que o projeto de decreto se refere às pessoas idosas com a recomendação de um "interesse especial em estarem recolhidas", mas, para o constitucionalista, o Governo parte de pressupostos errados.
"Estão a inverter-se as coisas. O Governo tem um dever jurídico especial de ajudar a que estas pessoas estejam recolhidas. O Governo é que tem de fazer o que puder - e, porventura, mais do que o que tem feito - para garantir que estas pessoas fiquem recolhidas em casa."
Para o professor, não há então nenhuma dúvida de que esta discriminação dos mais idosos é inconstitucional, também porque não cabe ao Governo legislar sobre esta matéria, e porque o Presidente da República suspende o direito de deslocação mas mantém o direito de as pessoas saírem à rua. "A forma como o Presidente colocou as coisas, de suspender este direito, e o Governo ter vindo restringi-lo discriminando entre quem tem mais ou menos de 70 anos, é absolutamente inadmissível, é inconstitucional", reforça.
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"É verdade que o Presidente salvaguarda que isto pode ser feito desde que não haja inconstitucionalidade, mas, se olharmos aos decretos do Governo, vemos que há discriminação. O Governo não tem competência para legislar esta matéria, apenas a Assembleia da República a tem."
Bacelar Gouveia, também constitucionalista, tem mais reservas em apontar a inconstitucionalidade nas restrições previstas para o novo Estado de Emergência."No limite, o que seria bom era que não houvesse suspensão de qualquer direito, mas às vezes é melhor abdicar de um direito pelo bem comum", comenta.
Bacelar Gouveia não deixa de admitir a existência de uma "modulação assimétrica", mas diz reservar para o momento do decreto de execução as suas conclusões, já que a assimetria pode ser "proporcionada e com fundamento objetivo medido por razões científicas".
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