Tancos. 'Secretas' acompanham lista de material roubado pela comunicação social
Secretária-geral do SIRP diz ainda que houve troca de informação com congéneres estrangeiras sobre "lista de compras" de organizações criminosas, mas que "não estava relacionada" com lista de material furtado.
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A secretária-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) admitiu, esta quarta-feira, na comissão parlamentar de inquérito sobre o furto do material militar em Tancos, que os serviços de informação acompanharam com "muito cuidado" a questão da lista de material desaparecido dos Paióis Nacionais, mas através da comunicação social.
"Digamos que não é uma lista oficial, ou seja, são informações que estamos a recolher basicamente através da comunicação social, mas, como são questões que relevam para a segurança interna, estamos a analisar e a seguir com muito cuidado", disse aos deputados Graça Mira Gomes, depois de questionada pela deputada Carla Barros, do PSD, que quis saber se o material furtado "poderia por em causa a segurança interna" ou "ser utilizado por organizações criminosas".
Ontem, na audição com antecessor de Graça Mira Gomes nos serviços de informações, o juiz conselheiro Júlio Pereira - que era à data do furto o responsável pelas 'secretas' - ficou a saber-se que serviços de informação estrangeiros partilharam uma "lista de compras" de armamento pretendido por organizações criminosas e que essa lista - que terá sido mencionada numa reunião da Unidade de Coordenação Antiterrorista (UCAT) - coincidia com o material furtado em Tancos.
Confrontada com as declarações de Júlio Pereira, a secretária-geral do SIRP disse, esta quarta-feira, não ter informação que possa relacionar a lista de material furtado com o material pretendido pelas organizações criminosas estrangeiras. "Preferia não entrar em detalhes, mas a nossa perceção é de que a lista não estava relacionada com as armas de Tancos", afirmou, em resposta ao deputado Telmo Correia, do CDS-PP, que lamentou o facto de a "lista de compras desaparecer e não se ter mais conhecimento dessa referência".
Pouco depois, foi o deputado Jorge Machado, do PCP, a insistir nas perguntas sobre a mesma lista. "A lista de compras não bate certo com o material furtado em Tancos?", questionou o deputado. "São processos diferentes, o dossier de Tancos e dessa lista de compras", adiantou Graça Mira Gomes que, perante a insistência do deputado - que voltou a pedir uma comparação entre ambas as listas -,acrescentou: "Eu não tenho a lista, não sei exatamente de que material se está a falar".
"Não tenho as listas dos materiais para fazer confrontações", justificou ainda a responsável das 'secretas', que sublinhou: "É um assunto que se passou antes de eu tomar posse".
Graça Mira Gomes invoca sigilo para não responder na comissão
Depois de várias perguntas sobre a "lista de compras", Jorge Machado, deputado do PCP, avançou com a possibilidade de a secretária-geral do SIRP prosseguir com respostas "à porta fechada", ou seja, sem a presença de jornalistas.
Após um breve debate sobre essa possibilidade, Ricardo Bexiga, deputado do PS e relator, tomou a palavra para explicar que, ao abrigo do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares, uma audição nesses moldes não resolveria o impasse.
"A senhora embaixadora tem sempre, enquanto funcionária e responsável com os poderes que tem, a possibilidade de alegar o sigilo e o segredo de Estado", disse, acrescentando: "A porta fechada não inibe essa possibilidade".
Uma oportunidade utilizada por Graça Mira Gomes que, sublinhando perante os deputados que participou na audição com a "máxima abertura e transparência", referiu não ser fácil "responder a algumas perguntas que são matéria sigilosa".
"É matéria sigilosa e não vou avançar mais sobre o assunto", concluiu, pouco depois de voltar a frisar que "não havia nexo" entre a "lista de compras" de organizações criminosas estrangeiras e a lista de material roubado em Tancos, em junho de 2017.
Na comissão de inquérito, Graça Mira Gomes disse ainda que a cooperação entre serviços de informação, forças e serviços de segurança e as forças armadas "funciona bem", mas que "pode ser sempre melhorada".
A comissão parlamentar de inquérito ao furto de material militar em Tancos tem previstas mais de 60 audições a personalidades e entidades e vai funcionar até 14 de junho, depois de o parlamento ter decidido prolongar os trabalhos por mais 90 dias.
A fase de audições de militares terminou na semana passada com a audição com o general Rovisco Duarte, chefe do Estado-Maior do Exército à data do furto, em junho de 2017.