Sociedade

Dermatologista do Santa Maria que recebeu 700 mil euros apresenta demissão

Mário Vasa (arquivo)

Miguel Alpalhão alega que a administração do hospital o tratou de forma "humilhante, degradante e persecutório"

O médico dermatologista Miguel Alpalhão apresentou esta sexta-feira a sua demissão do Hospital de Santa Maria (Lisboa), alegando que não lhe restava outra atitude perante o tratamento "humilhante, degradante e persecutório" que foi alvo por parte da administração.



"Lamentavelmente, não me resta outra atitude que não a demissão das minhas funções, perante a forma de tratamento com intuito humilhante, degradante, discriminatório e persecutório de que fui alvo ao longo do último ano por parte da administração do hospital", escreve o médico na carta a que a Lusa teve acesso.



Nessa carta, Miguel Alpalhão - que recebeu mais de 700 mil euros em três anos por cirurgias adicionais no Hospital de Santa Maria - refere que a denúncia do seu contrato, assinado a 1 de janeiro de 2024, terá efeitos a 12 de janeiro de 2026, no dia seguinte ao final da suspensão que lhe foi aplicada, com perda total de vencimento.

O médico salienta ainda que cessa o seu contrato com a "plácida consciência" de quem cumpriu as suas funções e obrigações de "acordo com as ordens superiores e procedimentos vigentes" no hospital, criticando a administração do Santa Maria.

"Assinalo, pois, que a suspensão de que sou alvo apenas visa mascarar um problema sistémico de falhas graves imputáveis à administração, como resulta, aliás, das recentes notícias que têm vindo a público, que merece ser conhecido e escrutinado", salienta o dermatologista.

Refere também que, com a suspensão de funções que lhe foi aplicada, pretendem fazer de si um "bode expiatório para lavar a imagem de uma instituição que não sabe assumir as suas responsabilidades e proteger" os seus colaboradores.

"Exijam-se responsabilidades a quem fez as regras e ordenou os procedimentos e não a quem os cumpriu, como contratualmente obrigado", escreve Miguel Alpalhão, para quem foi feita "tábua rasa" dos argumentos da sua defesa.

Perante isso, considerou que "só a via judicial permitirá que se faça justiça", adianta a carta que tem a data desta sexta-feira.

O médico salienta também que o serviço de dermatologia "tem muitos profissionais competentes e dedicados", desejando à diretora do serviço o "maior sucesso" para o reerguer.

Um relatório da Inspeção-Geral das Atividade em Saúde (IGAS), divulgado este mês, concluiu que o médico propôs, aprovou e codificou as suas próprias cirurgias mais de 350 vezes e que marcou consulta para os seus pais sem referenciação prévia obrigatória e operou-os, recebendo mais de 5500 euros.

A produção cirúrgica adicional é um regime que, no âmbito do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), permite a realização de operações fora do horário de trabalho normal das equipas, como aos fins de semana, para reduzir as listas de espera.

O relatório da IGAS foi enviado ao Ministério Público.

Lusa