"Sou surda, uma mulher de força e gosto de desporto." Joana Santos, a judoca que transforma "sofrimento energético" em medalhas de ouro
Portugal vai estar representado por 13 atletas nos Surdolímpicos, que decorrem em Tóquio, entre 15 e 26 de novembro. A TSF acompanhou toda a preparação e, durante esta semana, dá-lhe a conhecer aqueles que também são rostos de coragem, superação, ambição e crescimento no desporto. Joana Santos é o atleta desta quarta-feira.
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Joana Santos trocou o maiô pelo quimono e, aos 35 anos, conta com um currículo onde cabem dezenas de medalhas. Para quem questiona como é que conseguiu, a judoca portuguesa tem a resposta na ponta da língua. Como a ambição é o combustível dos campeões, Joana já sabe o que vai dizer aos mais novos que com ela partem para mais uma edição dos Surdolímpicos: "Não podemos desistir, estamos a representar Portugal."
"Sou surda, sou uma mulher de força e gosto de desporto." Foi assim que Joana Santos se apresentou à TSF no Centro de Alto Rendimento de Anadia, em Aveiro, onde decorreu a reunião de atletas surdolímpicos. Aos 35 anos, a judoca portuguesa é uma das mais experientes e medalhadas da missão portuguesa, resultado de um trabalho longo e de sucesso com o treinador Júlio Marcelino. A forma como nos falou do judo e destes Jogos não deixaram dúvidas de que deixar o ballet (onde entrou com seis anos) foi uma das melhores decisões que já tomou.
"Eu sinto-me bastante confiante. (...) Preparei-me com muito sofrimento e com muito esforço. Estamos todos focados em alcançar uma medalha. Treinamos todas as tardes. Não posso, nem sequer tive o desleixo de poder desfrutar um bocadinho das tardes. (...) Não é um sofrimento melancólico, pelo contrário. É um sofrimento energético. É com entusiasmo que marco presença nestes Jogos", afirmou.
A confiança de Joana tem razões de sobra. A atleta do Judo Clube do Algarve conquistou o primeiro ouro em Taipé (Taiwan), em 2009, foi prata nos Jogos de 2013, em Sófia (Bulgária), bronze em 2017, em Samsun (Turquia), sagrou-se campeã mundial em França, em 2021, e há três anos voltou a conquistar o ouro no Brasil, nos Jogos de Caxias do Sul.
Coincidência ou não, a medalha de campeã mundial em Versalhes foi conquistada no Dia Mundial do Judo (28 de outubro). Há dúvidas de que estava mesmo escrito? A Joana de nove anos, quando fez o primeiro treino de judo, não podia estar mais certa de que é nesta modalidade onde tem valor.
Contou-nos que, ainda assim, há quem questione como é tudo isto é possível, principalmente sendo surda, e explicou: "A única diferença aqui é mesmo a comunicação. Tanto surdos como ouvintes conseguem alcançar as medalhas. É supernatural. (...) De facto, a competição é um bocadinho diferente da dos ouvintes, (...) mas dentro daquele espaço somos todos atletas. Treino com atletas ouvintes. Essas dificuldades não as sinto. Pelo contrário, tenho sido sempre muito bem integrada."
No dia em que a TSF esteve no Centro de Alto Rendimento de Anadia, Joana e a parceira de treino Isabel Macedo comunicavam sem dificuldade. Tal qual como em todos os treinos. Isabel confessou-nos até que Joana é a única surda, "dá tudo" e a língua gestual "nem é uma questão": "Desde que ela [a Joana] fale com calma, repita... Quando não consegue, ela mesmo faz questão de ir ao telemóvel e mostrar, vai comunicando assim."
Os Jogos Surdolímpicos deste ano marcam a quinta participação de Joana Santos que, além do desporto, divide o tempo entre a família e o design de comunicação.
A experiência da judoca pode ser uma mais-valia para outros atletas que integram a Missão Portuguesa para Tóquio 2025, em particular para os mais novos. Pelo menos, é um "modelo" a seguir que Joana nos disse que espera ser.
"Temos vários estilos de atletas. Há aqueles que ficam mais ansiosos e gostam de algumas palavras de alento. Outros gostam muito mais de estar no seu espaço. Mas a verdade é que, enquanto modelo para esses jovens, seria muito importante poder também incentivar e não os deixar desistir naqueles momentos mais difíceis e que nem sempre correm bem. O importante é que os erros que acontecem hoje possam ser amanhã retificados. Não podemos desistir, estamos a representar Portugal", sublinhou.
Existem vários graus de surdez - leve, moderada, severa, profunda ou total - relacionados com os decibéis (capacidade de som que ouvido tem capacidade para captar). Joana não ouve de todo e, por isso, a comunicação com a TSF fez-se com a ajuda de uma intérprete.
Joana Santos é um das 13 atletas portuguesas nos Jogos Surdolímpicos deste ano, que decorrem de 15 a 26 de novembro, em Tóquio, no Japão.
Este ano assinala-se o centenário desta competição multidesportiva, cuja primeira edição decorreu em 1924. Tóquio acolherá aproximadamente 3.000 atletas de cerca de 80 países, que competirão em 21 modalidades distribuídas por 17 arenas.
Portugal somará a sua nona participação em Jogos Surdolímpicos, competição na qual já conquistou 17 medalhas.
