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É mais do que provavelmente o próximo autarca da cidade que nunca dorme, mas o primeiro de origem muçulmana. Zohran Mamdani tem, contudo, um adversário declarado na Casa Branca
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Zohran Mamdani nasceu em Kampala, capital do Uganda, filho de pais indianos, e vive em Nova Iorque desde os 7 anos. O socialista democrata de 34 anos lidera agora as sondagens e pode tornar-se no primeiro autarca de origem muçulmana e asiática a dirigir a cidade que nunca dorme
É tido como alguém que faz excelentes uso das redes sociais, que vai percorrendo os bairros novos e tanto fala inglês, como espanhol ou bengali. Não faz vídeos engraçados, aparentemente só faz vídeos com conteúdo político, seja sobre o elevado custo de vida, o estratosférico preço das rendas, que aumentaram mais de 50% nos últimos anos e quer congelar as rendas de mais de um milhão de pessoas que vivem casas com rendas controladas.
Propõe também autocarros e creches gratuitas e quer fazer isto aumentando os impostos dos ricos e dos super-ricos na cidade com mais bilionários em todo o planeta. Donald Trump chama às propostas Mamdani "ideias lunáticas e comunistas".
Antigos membros da equipa de Barack Obama dividem-se entre os que elogiam o candidato por abordar os problemas das pessoas e outros que encaram esta candidatura como uma radicalização do Partido Democrata.
Bernie Sanders, veterano senador do Vermont e figura de referência da ala mais à esquerda do partido, afirmou que Mamdani, em vez de receber dinheiro dos bilionários ou pôr anúncios "estúpidos" na televisão - a que já poucos ligam -, foi mobilizando milhares e milhares de pessoas em torno de uma agenda progressista que responde às necessidades das pessoas trabalhadoras e vai batendo às portas. Se Kamala Harris não tivesse ouvido os seus próprios consultores e tivesse feito como Mamdani seria hoje, diz Bernie Sanders, Presidente dos Estados Unidos.
Mamdani pode marcar uma mudança significativa na política da cidade. O resultado desta eleição provavelmente vai influenciar as prioridades políticas em questões críticas, desde a acessibilidade e a criminalidade, até à relação da cidade com o Presidente Donald Trump e o Partido Democrata Nacional.
Zohran Mamdani, que não recebeu o apoio de nenhuma figura proeminente do partido - exceto Alexandria Ocasio-Cortez e Bernie Sanders -, também rejeita firmemente as elites do partido. Afirma que o capitalismo tem falhas que devem ser corrigidas, diz que o sistema atual exclui a maioria social e discrimina as minorias para empoderar o clube dos 1% mais ricos.
O financiamento da campanha baseou-se em pequenos doadores individuais, em vez das grandes fortunas que costumam encher os cofres dos partidos.
Zohran Mamdani condena ainda a falta de clareza democrata sobre a agressão de Israel à Palestina e garante que prenderia o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, assim que pisasse Nova Iorque.
O congressista republicano do Tennessee Andy Ogles pediu à procuradora-geral Pam Bondi a retirada da nacionalidade ao nova-iorquino, a quem apelidou "pequeno Mohammed", acusando-o de omissão de simpatias extremistas durante o processo de naturalização. Mas do que se terá tratado, sim, foi o apoio do candidato a mayor de Nova Iorque à causa palestiniana.
Adversário declarado na Casa Branca
É, por isso, como se a corrida não fosse contra o ex-governador democrata Andrew Cuomo e contra o atual candidato republicano à liderança da cidade, Curtis Sliwa. O mais do que provável vencedor das eleições de Nova Iorque tem um adversário declarado na Casa Branca.
"Eu amo Nova Iorque. Sempre amei Nova Iorque. Não consigo acreditar que algo assim está a acontecer. Com um comunista no poder, é como voltar mil anos no tempo. Quer dizer, isso já aconteceu muitas vezes", atirou o Presidente norte-americano Donald Trump, quando questionado sobre Zohran Mamdani.
A máquina mediática Make America Great Again lançou-se a espalhar mentiras sobre ele. Mas Mamdani não é um "imigrante ilegal", nem tem qualquer ligação com os atentados de 11 de setembro de 2001 ou com o jihadismo, nem proferiu a frase "globalizemos a Intifada", nem é comunista, embora se assuma socialista.
Mesmo assim, Trump repetiu a mentira de que Zohran Mamdani é um indocumentado, acrescentando a frase "vamos investigá-lo" quando questionado sobre uma eventual deportação. Também disse que, se como presidente da câmara, Mahmadani se recusar a colaborar com os agentes de imigração, então teria de ser preso.
Donald Trump antecipou esta vitória mais do que provável na eleição desta terça-feira como uma derrota para o país: "É uma coisa terrível para o nosso país, aliás. Ele é comunista. Vamos para uma cidade comunista? Isso é muito mau para Nova Iorque. Mas o resto do país está a revoltar-se contra isso."
Zohran Mamdani foi contundente na resposta: "Donald Trump disse que eu deveria ser preso, que eu deveria ser deportado, que eu deveria ser desnaturalizado. E ele disse essas coisas sobre mim, alguém que está prestes a ser o primeiro presidente da câmara imigrante desta cidade em gerações, alguém que também será o primeiro muçulmano e o primeiro presidente da câmara sul-asiático na história desta cidade... ele disse isso não tanto por causa de quem eu sou, de onde venho, da minha aparência ou forma de falar, mas mais porque ele quer desviar a atenção daquilo por que luto. Luto pelos trabalhadores. Luto pelas pessoas que foram expulsas desta cidade por causa dos preços."
As declarações do Presidente, diz o candidato do partido democrata a mayor de Nova Iorque, não representam apenas um ataque à democracia, mas uma tentativa de enviar uma mensagem a todos os nova-iorquinos que se recusam a esconder-se nas sombras. E concluiu: "Não aceitaremos esta intimidação."
Mahmdani ganhou as primárias do partido democrata quando era um perfeito desconhecido para o mundo, mas não para aqueles que o viram calcorrear as ruas de Nova Iorque, falando ora inglês, ora espanhol, ora bengali, na ressaca da derrota presidencial de Kamala Harris, já a prometer transportes gratuitos, se vencesse as eleições na cidade que nunca dorme em novembro do ano seguinte.
Novembro do ano seguinte é agora. Esta terça-feira.