Tribunal Europeu dos Direitos Humanos analisa queixa que pode mudar futuro da ação climática
Os jovens responsáveis pela queixa argumentam que 32 países, Portugal incluído, não estão a tomar as medidas necessárias para que o aquecimento global não ultrapasse os 1,5 graus celsius em relação à época pré-industrial.
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O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) aprecia esta quarta-feira uma queixa de seis jovens portugueses contra 32 países, um caso inédito ligado ao ambiente e que pode mudar o futuro da Europa na luta contra a crise climática.
Se o TEDH aceitar a queixa dos jovens pode criar jurisprudência que obrigue os Estados europeus a tomarem mais medidas para impedir o aquecimento global.
Os seis jovens, com idades entre os 11 e os 24 anos (André, Catarina, Cláudia, Mariana, Martim e Sofia) argumentam que os 32 países, Portugal incluído, não estão a tomar as medidas necessárias para que o aquecimento global não ultrapasse os 1,5 graus celsius em relação à época pré-industrial, um dos objetivos do Acordo de Paris sobre o clima, de 2015.
Os jovens salientam que as alterações climáticas estão a causar tempestades muito fortes no inverno e que no verão o aumento da temperatura causa mais incêndios.
Dizem que sofrem de ansiedade causada pelas catástrofes naturais e pela perspetiva de um futuro assim e dizem que os países não estão a cumprir os artigos do "direito à vida" e do "direito ao respeito pela vida privada e familiar", da Convenção dos Direitos Humanos.
Em declarações à TSF, Pedro Neto, diretor da Amnistia Internacional Portugal, conta que os jovens portugueses foram muito influenciados pelos incêndios de 2017 na região de Leiria, "que viveram de perto".
Se o processo for bem-sucedido, os Estados em causa terão que "trabalhar em políticas concretas" para cumprir o que prometerem, sob pena de sofrer "sanções e multas".
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"Aquilo que vemos que está a acontecer é sobretudo muita retórica, muita publicidade, muito marketing ambiental, quer dos Estados, quer dos governos, quer de grandes empresas, mas depois a ação concreta e os passos que são precisos tomar e que a ciência já mostrou o caminho para para ser feito não são seguidos!, lamenta. "É também esta hipocrisia de governantes e de grandes empresas que está a ser posta em causa."
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O processo foi apresentado em 2020. Se o TEDH o aceitar, os países podem ser legalmente obrigados a tomar medidas que politicamente não estão previstas para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa.
De acordo com uma investigação da organização internacional "Save the Children" uma criança nascida em 2020 sofrerá, em média, quase sete vezes mais ondas de calor durante a sua vida do que a geração dos seus avós.
Os direitos das crianças devem ser protegidos imediatamente, dada a ameaça sistémica que as alterações climáticas representam e o seu grave impacto em todas as crianças, diz a organização em comunicado.
Recorrer aos tribunais a propósito da inação dos países em relação às alterações climáticas é cada vez mais frequente, indica um relatório recente da ONU, segundo o qual em dezembro passado havia 2180 casos relacionados com o clima apresentados em 65 entidades, incluindo tribunais internacionais, regionais e nacionais, e outros como tribunais de arbitragem. Em 2017 tinham sido apresentados 884 casos e em 2020 1550. Os casos mais do que duplicaram em cinco anos.
Crianças e jovens, grupos de mulheres, comunidades locais e povos indígenas são alguns dos proponentes. Também estão a surgir, diz-se no relatório, ações contra empresas.