Nos últimos dias tenho sido abordada por diversas pessoas que questionam a posição assumida pelos diretores de jornais e revistas que, unidos, alertaram para o risco que seria, para a democracia, o fim da distribuição diária em oito distritos do Interior. Perguntam-me, por exemplo, se não é mais eficaz e barato disponibilizar assinaturas digitais e dar formação a populações envelhecidas. Perguntam-me ainda quantos jornais se vendem nesses distritos e qual a quota de mercado respetiva.
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Recapitulemos o que está em causa. A VASP, a única empresa que distribui jornais e revistas no país, invocou dificuldades financeiras para ameaçar abandonar oito distritos em que as rotas são deficitárias. Nos últimos dias recuou e afirmou que este seria apenas um cenário em estudo, enquanto aguarda respostas de apelos lançados ao Governo, autarcas e comunidades intermunicipais.
Vamos ignorar as estatísticas de vendas, para retirar a carga fria que os números colocam sobre este tema. Aceitemos igualmente ignorar indicadores financeiros, ainda que o volume de negócio em papel continue a ser vital para a sustentabilidade dos editores. Podemos igualmente deixar de lado o aspeto sublinhado pelo manifesto público dos diretores, relativamente aos riscos da desinformação e à importância do acesso a informação verificada e confirmada para a saúde da democracia.
Mesmo que ignorássemos todos estes fatores, sobram dois que não podem ser ignorados. Desde logo, quem vive no Interior não é cidadão de segunda e não pode continuar a perder o acesso a bens e serviços como se tal fosse uma inevitabilidade. Por outro lado, não é exatamente igual entregar uma assinatura digital ou um jornal em papel. O papel é muitas vezes lido à mesa do café ou no centro de dia. É ponto de encontro e de conversa, ferramenta de treino cognitivo, meio através do qual se combate o isolamento e o envelhecimento. Não há números nem estatísticas que o expliquem. Só o sabe quem conhece o território. Os mesmos que ouvem as declarações sobre o facto de ser "inoportuno" discutir a regionalização, ou as promessas de descentralização e reforço da coesão territorial, e assistem a um esvaziamento lento de tudo. Um jornal não é só um jornal. É mais uma perda, entre tantas.
