"A parte boa é que é facultativa." Redução da prestação da casa será pagar "juros sobre juros"
À TSF, João Borges de Assunção diz que isso só não acontecerá se o Estado financiar os bancos.
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Uma medida que permite às famílias fixar a prestação do crédito à habitação durante dois anos só é boa porque é facultativa, considera o economista João Borges de Assunção.
"A parte boa é que é uma faculdade, ou seja, as pessoas que estão endividadas tem a faculdade de optar por um regime ou optar pelo regime anterior. Numa visão muito míope de curto prazo, quem optar por esta regime vai pagar uma prestação menor durante dois anos, mas ninguém sabe, daqui a algum tempo, se a taxa de juro será maior ou menor que a atual. Ninguém sabe quanto é que essa taxa estará daqui a seis anos", diz à TSF o economista.
O Governo apresenta a medida baseando-se no pressuposto de que as taxas de juro vão baixar. No entanto, para João Borges de Assunção, é um erro: "Isso é um erro banal, porque o Governo também não é muito bom a gerir o risco da taxa de juro. Portanto, o próprio Governo está endividado e pode ter de pagar muito mais juros do que os que paga atualmente, devido à subida da taxa de juro, e o Governo não tem a certeza que vai pagar menos juros pelo seu endividamento daqui a dois ou três anos do que paga agora. Mas o Governo, pelo menos, tem técnicos profissionais no Ministério das Finanças e está apto a fazer a gestão dessa taxa de juro e as famílias não estão, como é óbvio. Não estão preparadas para isso, nem tem de estar. O que acontece é que esta medida, na prática, aumenta a dívida das famílias, ou seja, reduz a prestação mensal, mas as famílias vão ter de pagar esses juros mais tarde e, como é óbvio, os bancos quando fizerem as simulações, essas simulações virão certamente com juros maiores. Não, não há outra forma, não é possível de outra forma."
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O docente da Universidade Católica e antigo assessor económico de Cavaco Silva acredita que as famílias que optem por esta opção vão acabar vão acabar por pagar juros sobre juros, a não ser que o Estado financie os bancos.
"Não há maneira nenhuma de não pagarem juros sobre juros. O que o ministro garantiu, penso eu e o que eu acho que é verdade, é que como a compensação é apenas sobre os juros, quem mudar de regime não poderá aumentar o montante que têm dívida. Portanto, obviamente será verdade, não é? Mas quando as simulações forem feitas, os bancos têm de apresentar uma simulação que corresponda aos seus custos. Não tem outra alternativa, não é um problema dos bancos serem bons ou maus, não têm outra alternativa", afirma.
Pela positiva, o economista destaca a eliminação das comissões pelos reembolsos antecipados do crédito.
"As pessoas normais que, de toda a boa-fé, contraíram os empréstimos para comprar habitação, de facto, nunca sonharam que iriam pagar estes montantes anos depois. Portanto, as pessoas que foram responsáveis, no sentido que tiveram um comportamento igual a todas as outras pessoas normais, veem-se agora numa situação que estão fora do seu orçamento. Nesse sentido, antecipar as suas dívidas é o melhor remédio. Inclusive, se for preciso alienar a casa e mudar para uma casa mais pequena ou mudar para o mercado de arrendamento. Porque, de facto, as pessoas estão expostas a um risco muito grande e a medida do governo de reduzir a prestação é equivalente a aumentar a dívida, porque as pessoas vão pagar a sua dívida mais tarde e não reduzi-la, o que seria para mim o bom conselho", argumenta.
João Borges de Assunção defende que o governo devia fazer pedagogia para incentivar a taxa fixa nos créditos à habitação.