"Exposição pode ser uma dor violentíssima." Isabel Moreira contra violação como crime público
A deputada do PS considera que a classificação da violação como crime público implica a exposição da vítima, por vezes, contra a sua vontade, acrescentando que a natureza dos crimes de violência doméstica e de violação não são comparáveis.
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Isabel Moreira, deputada do Partido Socialista, está contra a possibilidade da violação vir a ser considerada crime público. Em declarações à TSF, a deputada defende que a lei já é equilibrada em defesa da vítima e que a classificação como crime público implica sempre a exposição da vítima, por vezes, contra a sua vontade.
"A partir do momento em que alguém, contra a minha vontade, expõe o facto de eu ter sido violada, eu já estou exposta. Isso é uma dor violentíssima", considera.
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Para a deputada socialista, a natureza dos crimes de violência doméstica e de violação não são comparáveis.
"Isto é um crime contra a liberdade sexual e a violência doméstica tem características diferentes em que a integridade física da vítima está posta em causa e há uma lógica de subordinação contínua, de fechamento dentro de uma realidade familiar em que a subjugação emocional, a autonomia da vítima em tomar decisões vai sendo esgotada, há ali uma permanência que não existe no crime de violação", explica.
A lei prevê, desde 2015, que o Ministério Público possa classificar crimes de violação como crime público "sempre que o interesse da vítima o aconselhe". Isabel Moreira entende, por isso, que a lei já é equilibrada.
"O equilíbrio que foi encontrado em 2015, quando fizemos uma alteração do código penal, no sentido de, em alguns casos, o Ministério Público atuar por entender que era do interesse da vítima é um equilíbrio importante. Não deixar nenhum espaço para a própria pessoa adulta fazer uma valoração e não entendermos que a modernidade está precisamente em encontrarmos mais fórmulas para responder aos anseios das vítimas para encontrarem o seu processo curativo que não seja só direito penal, isso para mim não é modernidade alguma", defende.
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Um grupo de 18 mulheres de diferentes quadrantes políticos e muitas ligadas ao Direito assinaram uma carta aberta para pedir a consagração da violação como crime público, considerando ser o caminho para proteger as vítimas e assegurar a sua liberdade, idoneidade e autodeterminação.
A carta aberta, à qual a TSF teve acesso, é intitulada "razões e condições para a consagração da violação como crime público", sendo as promotoras do documento a deputada do BE Joana Mortágua e a antiga dirigente da Iniciativa Liberal Maria Castello Branco.
"As signatárias desta carta aberta consideram que o combate aos crimes sexuais e a proteção das suas vítimas exige um debate profundo na sociedade portuguesa. É nesse contexto que lançamos o repto sobre a consagração da violação, um crime de violência muito grave, como crime público - ou seja, passível de ser denunciado e investigado sem intervenção da vítima, num quadro de proteção da identidade da vítima", pode ler-se no documento.
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Entre as subscritoras desta carta estão nomes como as deputadas Joana Barata Lopes (PSD) e Carla Castro (Iniciativa Liberal), a ex-ministra da Justiça Paula Teixeira da Cruz e as antigas deputadas do PSD Teresa Morais e Teresa Leal Coelho.
No final de abril, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, recebeu uma petição que juntou mais de 100 mil assinaturas a pedir precisamente que a violação seja crime público.
Um dia antes, o BE voltou a apresentar um projeto de lei para consagrar a violação como crime público para que não se continue a "abandonar as vítimas a si próprias".