Governo escolhe "não enfrentar o Presidente" ao alterar o decreto-lei sobre carreira dos professores
O especialista em Direito Constitucional Vitalino Canas defende que o Executivo de António Costa não quis "ficar completamente isolado", por isso procurou garantir que o Marcelo aparecia "na fotografia da solução".
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O constitucionalista Vitalino Canas entende que o Governo decidiu "não enfrentar o Presidente da República" ao alterar o decreto-lei sobre carreira dos professores e devolver o diploma a Belém, após o veto de Marcelo Rebelo de Sousa.
"O Governo poderia aqui ter simplesmente transformado o seu decreto-lei, o conteúdo do decreto-lei, vertê-lo numa proposta de lei e fazê-lo aprovar pela Assembleia da República, onde - como se sabe - existe maioria absoluta, mesmo que o Presidente depois exercesse o direito de veto, a maioria parlamentar poderia sempre nestas matérias reaprovar e seria uma forma de enfrentar o Presidente", explica, em declarações à TSF.
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O especialista em Direito Constitucional defende, contudo, que o Executivo optou por outra via e "aparentemente, não quis enfrentar o Presidente, não quis insistir no conteúdo tal como ele estava inicialmente e está a procurar ir ao encontro daquilo que o Presidente terá dito".
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Por ser um tema "socialmente muito relevante, que mexe muito com as pessoas", Vitalino Canas acredita que o Governo de António Costa não quis "ficar completamente isolado neste aspeto", ao ter Marcelo Rebelo de Sousa contra, bem como "a maior parte dos partidos da oposição", pelo que a revisão do decreto-lei permite "evitar novos fatores de fricção com o Presidente da República" e garantir que, pelo menos, também o chefe de Estado "aparecesse na fotografia da solução encontrada".
O constitucionalista sublinha ainda que "ao contrário do que se sucede com as leis da Assembleia da República", não existe aqui o "instituto da reaprovação" e traça os dois caminhos que Rebelo de Sousa pode seguir.
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"Aqui o que se pode suceder é o Presidente fazer uma de duas coisas: ou entender que o Governo foi suficientemente maleável na introdução das suas observações no diploma e então promulga, ou entende que o Governo continua longe daquilo que é a sua ideia em relação ao assunto e não promulga, portanto, exerce de novo o direito de veto", esclarece.
Vitalino Canas aponta ainda que não foram "levantadas dúvidas constitucionais", porque "desde logo há quem entenda que não se pode exercer este veto que o Presidente exerceu no artigo 136 da Constituição com fundamento em dúvidas de constitucionalidade", por isso, Marcelo não "quis levantar essas dúvidas, mesmo que as tenha". Para o especialista, o Tribunal Constitucional ainda não é uma hipótese fora de jogo.
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"Admito que se possa discutir, a esse nível, a questão do princípio da violação da igualdade entre professores que estão no continente e professores que estão nas regiões autónomas. Admito que seja uma questão que possa ser objeto de debate no Tribunal Constitucional", reitera.
O Conselho de Ministros reapreciou, esta quinta-feira, o decreto-lei sobre a progressão da carreira dos professores que o Presidente da República tinha vetado na quarta-feira. A ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, disse que "não vai detalhar" as alterações.