IL quer saber se secretário de Estado da Defesa infringiu estatuto do gestor público
Iniciativa Liberal questiona governo sobre um antigo contrato assinado entre Marco Capitão Ferreira e a Direção-Geral de Recursos da Defesa, à época presidida por Alberto Coelho. Está em causa uma possível infração do estatuto do gestor público que é refutada, à TSF, pelo secretário de Estado.
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Aos 25 dias do mês de março de 2019, Marco Capitão Ferreira, atual secretário de Estado da Defesa, é contratado pela Direção-Geral de Recursos da Defesa (DGRDN) para uma prestação de serviços de assessoria, com um prazo de execução de 60 dias e com uma retribuição de 50 mil euros aos quais acresce o valor do IVA. A dúvida agora suscitada pela Iniciativa Liberal está no facto de, durante esse período de dois meses, este mesmo responsável ter sido nomeado presidente de uma empresa pública.
À TSF, o líder parlamentar Rodrigo Saraiva nota que Marco Capitão Ferreira "estabeleceu um contrato com o Estado e, passado um mês, é nomeado presidente da Empordef e, portanto, passa a estar ao abrigo daquilo que é o estatuto do gestor público", sendo que, perante a lei, "não se pode ter depois um contrato de prestação de serviços com o Estado".
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Diz o artigo 20.º deste estatuto que "o exercício de funções executivas tem lugar em regime de exclusividade", estando previstas exceções, mas não o caso desta assessoria técnica contratada pela DGRDN.
Já o contrato assinado por Capitão Ferreira, disponível para consulta no portal Base, foi celebrado através do procedimento de consulta prévia, que implica um convite a, pelo menos, três entidades, e determinava a "elaboração de pareceres e outros trabalhos especializados no âmbito da Lei de Programação Militar, bem como integrar e apoiar as equipas de negociação e elaborar notas de suporte ao processo decisório subsequente".
Ciente disto, a Iniciativa Liberal quer saber se houve acumulação de funções ou se o contrato foi denunciado; não tendo acumulado, qual o valor que recebeu ou se houve dinheiro a ser devolvido. Além disso, o partido questiona ainda "qual foi o trabalho efetivamente desenvolvido por Marco Capitão Ferreira para a DGRDN" e, tendo sido desenvolvido, é pedido o relatório que decorreu desse serviço.
Em resposta às perguntas da TSF, Capitão Ferreira, através da assessoria de imprensa, informa que "o contrato foi executado", tendo cessado devido à conclusão dos serviços contratados. Considera o governante que "não houve nenhuma violação do Estatuto do Gestor Público", sublinhando que "o início de funções na Empordef ocorreu a 29 de abril de 2019".
Para que não haja violação da lei, face ao exposto pelo secretário de Estado, o trabalho de assessoria só poderá ter sido realizado num período máximo de 34 dias.
Ainda antes desta resposta do ministério à TSF, Rodrigo Saraiva já atalhava a possibilidade de cumprimento do contrato: "Surpreendentemente, se no espaço de um mês, este trabalho de assessoria técnica para uma contratação de equipamento no âmbito da lei de programação militar foi cumprido, estamos também a requerer aquilo que são certamente os relatórios que existem de comprovativo de que esse contrato foi cumprido com zelo por parte do cidadão Marco Capitão Ferreira".
Para o líder parlamentar da IL, "se se vier a comprovar que houve um incumprimento por parte do cidadão Marco Capitão Ferreira" neste processo, "não há condições, obviamente, para estar em funções governativas". "Isso é uma parte de responsabilidades políticas que estas perguntas também pretendem apurar", nota.
Ligação a Alberto Coelho
Na pergunta endereçada à ministra da Defesa sobre este assunto, a Iniciativa Liberal faz questão de frisar que "a DGRDN surgiu envolvida em casos de alegada corrupção que vieram a público, envolvendo Alberto Coelho e com quem Marco Capitão Ferreira assinou este contrato".
De resto, o caso já fez correr muita tinta, não só pela derrapagem nas obras do antigo Hospital Militar de Belém, mas também pela nomeação de Alberto Coelho para presidir a uma empresa pública da esfera das indústrias de Defesa - a ETI - numa altura em que já existiam suspeitas de ilegalidades e que se traduziram posteriormente na chamada "Operação Tempestade Perfeita".
No âmbito deste caso, Alberto Coelho é suspeito de "dois crimes de corrupção passiva em co-autoria" e de "um crime de branqueamento", também em co-autoria.
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Na questão a que a TSF teve acesso, a Iniciativa Liberal lembra precisamente a nomeação de Alberto Coelho para a empresa pública por sugestão de atual secretário de Estado. De resto, foi o próprio Marco Capitão Ferreira quem admitiu à TSF, em novembro de 2021, que tinha sido ele a manifestar essa vontade, colocando um ponto final nas contradições que existiam na praça pública sobre a ideia original de nomear o ex-diretor-geral.
"A nomeação ocorreu efetivamente com base numa manifestação de interesse que foi por nós veiculada face à disponibilidade do próprio [Alberto Coelho] por ter terminado o mandato. A mesma teve um racional, aliás bem espelhado nas declarações do ministro da Defesa Nacional", escreveu, à época, Capitão Ferreira.
Já uma investigação da SIC emitida esta semana, citando "informações recolhidas" no processo Tempestade Perfeita, avança que "terá sido o próprio Alberto Coelho a escolher o lugar a ocupar: a presidência da ETI". Lugar esse que também já tinha sido ocupado por Marco Capitão Ferreira antes de presidir à idD Portugal Defence, a empresa-mãe da ETI.