A psiquiatra forense do Hospital Prisional de Caxias alerta que "antes de fazer uma casa, é preciso ver as fundações". Mas avisa que o grande desafio é explicar o que é uma doença mental.
Corpo do artigo
A nova lei, publicada em 21 de julho de 2023, troca a expressão "anomalia psíquica grave" por "doença mental", mas, para Susana Pinto Almeida, alterar conceitos não é suficiente. É preciso que os psiquiatras e a restante sociedade falem a mesma linguagem, neste assunto.
Para os médicos especialistas, trata-se de uma alteração psíquica tão grave que impede a pessoa de perceber que está doente, não pedindo, nem aceitando, qualquer ajuda que lhe seja oferecida. Para o cidadão comum, "tudo o que for aberrante, bizarro, ou que fuja ao normal daquela pessoa" é visto como doença mental.
TSF\audio\2023\07\noticias\24\entrevista_susana_pinto_almeida
Susana Pinto Almeida alerta que faltam camas de internamento nos hospitais psiquiátricos e há doentes que não podem esperar, sob pena de, não sendo à partida inimputáveis, poderem vir a tornar-se. A psiquiatra prisional de Caxias considera urgente uma intervenção preventiva, evitando, assim, uma "crónica de um crime anunciado".
Entrevistada pela TSF, esta especialista considera que a nova lei é necessária, mas está longe da realidade existente em Portugal. O diploma prevê o regresso à sociedade de inimputáveis que continuam privados de liberdade, apesar de já terem cumprido todo o tempo de internamento que lhes foi decretado. A Direção-Geral da Reinserção e Serviços Prisionais estima que sejam cerca de 50 pessoas.
Em 2003, Susana Pinto Almeida fez mestrado com inimputáveis considerados perigosos, doentes de esquizofrenia, na cadeia de Santa Cruz do Bispo, onde existe a única unidade de inimputáveis em meio prisional. Ela começa por lembrar que não se trata de presos comuns, até pela própria definição de "inimputável". Muitos continuam privados de liberdade após o termo da medida de segurança em internamento, por falta de respostas sociais.
Um problema, defende a psiquiatra forense, que afeta qualquer doente mental e que faz com que a nova lei seja "necessária", mas desajustada da realidade: "Claramente, não é uma lei para o país que existe agora."
Ainda assim, Susana Pinto Almeida não vê razões para que os inimputáveis considerados perigosos, não possam regressar à sociedade, porque "se estiver recuperado do ponto de vista psíquico, a reabilitação é desejavelmente feita em interação com o meio. E quanto mais cedo, melhor".