"Sistema viciado." Mais de metade das vagas para médicos internos ficou por preencher
A diretora do internato do Hospital de Santa Maria avisa, na TSF, que "ou se corta este ciclo vicioso, ou o problema vai agravar-se".
Corpo do artigo
Mais de metade das vagas para médicos internos nos hospitais portugueses ficaram desocupadas e há várias razões para que isso aconteça: a pressão nas urgências, a carga horária ou a forma como são remunerados, bem como as marcas da Covid-19 que ainda restam, afastam os médicos dessa formação.
A diretora do internato do Hospital de Santa Maria, Filipa Lança, avisa que estes sinais não auguram nada de bom.
"Fico preocupada, mas mais do que preocupada com o meu centro hospitalar, fico preocupada com o que se está a passar ao nível do país, porque, se olharmos para a medicina interna, foram 58% das vagas do país que não foram ocupadas", diz a médica à TSF.
TSF\audio\2023\11\noticias\27\dora_pires_15h
Filipa Lança explica que esses são os profissionais "que estão à frente nas urgências, no atendimento direto aos cidadãos - que nos procuram com problemas de saúde urgentes - e é essa formação que neste momento está a ser carenciada".
Há hospitais privados que também já fazem formação, mas, mesmo esses, não conseguiram preencher todas as vagas que abriram, apesar de as condições para os médicos internos serem aparentemente melhores para o futuro.
"Como interno, pensando no futuro onde quer ficar a trabalhar como elemento efetivo, acha que se fizer lá formação, maior possibilidade tem de ficar depois como especialista", explica Filipa Lança.
Apesar disto, mais de metade das vagas no país ficaram por preencher, porque, já que o sistema o permite, a maioria prefere começar como médico tarefeiro, situação em que ganha mais a fazer menos.
"Quando percebe que não quer uma especialidade, porque essa possibilidade não tem interesse futuro pela carga horária, pela forma como é remunerado, por inúmeros problemas, e sabe que pode ficar contratado como tarefeiro a trabalhar um, dois ou três dias por semana gerindo o seu tempo, tendo o resto do tempo a trabalhar para tentar um ano ou dois depois, escolher uma especialidade que interessa mais para futuro, qualquer um acabaria por fazer o mesmo", justifica.
Este é um problema que Filipa Lança considera que é preciso resolver: "No fundo, o sistema está viciado e, estando num sistema viciado, ou se corta este ciclo vicioso, ou o problema vai agravar-se. Não há maneira de dar a volta."
Quanto mais especialistas faltam nos hospitais portugueses, mais se recorre aos médicos tarefeiros e quanto mais ganham estes médicos, mais atrativo se torna este caminho.