O padre Lourenço Fontes vai juntar sal na mistela à base de aguardente para aumentar o seu poder protetor contra o mal. É um dos pontos altos da festa de rua nesta vila do distrito de Vila Real, que atrai milhares de pessoas e movimenta a economia local.
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É sexta-feira 13 e em Montalegre há bruxas à solta. Uma das maiores festas de rua do país volta a atrair milhares de pessoas à terra do padre do Lourenço Fontes, que quando for meia-noite há de preparar uma nova queimada de aguardente com limão, maçã, canela e açúcar para aquecer as almas. Este ano até vai levar sal, para reforçar o poder contra o mal.
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"Quando a estiver a preparar a queimada vou lá enfiar uma mão-cheia de sal. Antigamente deitava-se por cima do lombo das vacas para as bruxas não lhe entrarem. Era o que a minha mãe fazia quando a cria era levada à feira", explica o padre, que ainda continua a ser símbolo do misticismo nesta terra da região do Barroso.
As bruxas nem sempre são levadas a sério, pelo menos em voz alta. Ana Gomes, de 87 anos, mais conhecida por "minhota", "nunca" as viu e prefere levar a coisa para a brincadeira. "Deus deixou de tudo no mundo, bom e ruim", sorri a mulher bem-disposta, que vive em Meixide. A vizinha, Maria Atilhó, 80 anos, também não é crente, nem nunca as viu, mas acredita que "há mau olhado".
"Bruxas é o que há mais por aí", brinca Fernando Pires, 76 anos, na aldeia de Solveira. Mas nunca as viu montadas em vassouras voadoras. "Andam encarapuçadas. Parecem normais, mas não o são". Fernando brinca com o assunto, pois assume que "é tudo um mito". A mulher, Maria Pires, prefere dizer como os espanhóis, "Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay".
Por seu lado, o padre Lourenço Fontes opina que "toda a gente acredita em bruxas. De uma forma ou de outra toda a gente crê que existem interferências de pessoas com capacidade para estorvar, incomodar ou amarrar. Há uma veia cultural herdada dos Celtas que leva a supor a existência de males inexplicáveis e a bruxa é sempre a culpada".
Sendo crente ou não, é pelas bruxas que milhares de pessoas rumam a Montalegre nesta sexta-feira 13 e são os negócios locais os que mais lucram com a romaria. De acordo com a presidente da Câmara de Montalegre, Fátima Fernandes, a Sexta-13 continua a ser "um dos maiores e mais emblemáticos espetáculos de rua do país" e continua a "atrair milhares de visitantes, faça chuva, neve ou sol".
A Feira do Esconjuro abre às 13h13. Às 23h00, no castelo, realiza-se o espetáculo "O Novo Inferno" e prepara-se a queimada. Leva mil litros de aguardente, açúcar, vinho, maçã, canela e outros preparos. Este ano também vai ter sal. Ficará ainda mais forte e quem a tomar poderá "esconjurar todos os males. Porque a mistela, acrescenta o padre Fontes, "entusiasma, anima e liberta dos traumas e das bruxas". A festa termina já depois da meia-noite, junto à Câmara, com a "Chulada da Ponte Velha".