Num momento em que se luta cada vez mais por um planeta sustentável, a reciclagem, um bem ao dispor de todos, ainda não é feita na totalidade, com a existência de mitos e outros fatores que afastam as pessoas dos ecopontos.
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O lixo faz parte da nossa vida, é um facto, mas saber o que fazer com ele é uma necessidade, uma obrigação de cada um e, acima de tudo, uma forma de contribuir ativamente para o bem do planeta, de um planeta cada vez mais necessitado de ajuda. Os três 'R' (reduzir, reutilizar e reciclar) têm de ser parte da nossa vida e a separação do lixo tem de ser uma realidade sem 'ses'.
"Há todo o tipo de desculpas para as pessoas não participarem." As palavras são da responsável pela comunicação da EGF - Environment Global Facilities, uma empresa de tratamento e valorização de resíduos em Portugal.
O trabalho feito nos últimos tem surtido efeitos e os portugueses estão a reciclar mais e melhor. Porém, há um caminho a percorrer. "As pessoas não reciclam tudo, não reciclam sempre e não reciclam em todo o lado", alerta Ana Loureiro, explicando que muitas reciclam apenas papel, outras vidro e há também quem só "recicle em casa", não o fazendo no trabalho, em eventos, na rua.
"Não é tudo e não é sempre", reforça. No fundo, a reciclagem já começa a fazer parte de uma rotina, mas tudo o que está para lá desse dia a dia fica de fora. "Ninguém recicla nas férias", exemplifica.
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Os adultos que é preciso conquistar
A grande dificuldade está em chegar aos adultos, é o grupo alvo mais difícil de atingir por estar "entalado entre as crianças e os pais" e por ter uma vida ocupada. Até agora, as campanhas não se focaram nesta faixa etária, mas Ana Loureiro acredita que isso "vai mudar", já que "as metas estão tão próximas que se não for com os adultos empenhados em participar, isto não vai lá".
No mundo da reciclagem são as mulheres as "mais preocupadas e as que mais separam os resíduos para reciclar", porém a motivação é um fator fundamental a ter em causa. Ao contrário do último ano, a crise que afetou Portugal levou a um "abandono do investimento em campanhas de comunicação" e isso tem efeitos imediatos: "Os números baixam, as pessoas desmotivam."
A força dos miúdos
As campanhas constantes com foco nos mais jovens são um ponto essencial para a reciclagem. A criança é a primeira a transmitir o que ouve na escola, a implementar a necessidade da reciclagem em casa, a passar a palavra aos pais e a 'obrigar' na ajuda ao ambiente.
Nas escolas e em eventos, as crianças aprendem a reciclar, a entender a importância do gesto e passam-no às gerações mais velhas. O problema está no passo seguinte: "As crianças crescem, começam a preocupar-se com outro tipo de coisas e não podemos largar este cidadão porque ele depois vai ser adulto, vai esquecer-se ou não vai querer fazer."
A tara e a motivação económica
Muitas vezes a motivação vem acompanhada de dinheiro. Não há como negar. "Quando o benefício é económico e direto ao bolso de cada um a participação aumenta." Ana Loureiro recorda uma campanha teste num supermercado, em que os cidadãos receberam dinheiro em cartão e os números não metem, "foi espectacular".
A questão do pagamento em troca da reciclagem traz para cima da mesa o tema da tara, existente em vários países. Joana Xavier, da Valorsul, recorda que nos locais onde existe esse sistema "as pessoas pagam mais para virem a receber essa tara". "Não recebem para reciclar, ninguém recebe para reciclar, o modelo não é rentável", explica.
Ana Loureiro acrescenta que essa mudança implica uma "grande mudança" em Portugal, tendo em conta que isso "ia aumentar o preço dos produtos e é preciso estarmos todos disponíveis para que isso aconteça".
"As pessoas estão mais preocupadas em terem um prémio pelo seu bom comportamento, sem que isso implique um acréscimo de custo pelo material que entra no mercado e que se vai transformar em resíduos", explica.
A ambição de fazer melhor
Portugal pode orgulhar-se de ser "dos poucos países do mundo que tem uma sinalética nacional aprovada". Contudo, a ambição não pode ser colocada de parte, já que olhamos para os outros países e "dizemos que reciclam muito". "Também investem muito, têm recolhas porta a porta muitas vezes espalhadas pelo país inteiro", justifica a responsável da EGF.
"Para podermos ter sistemas com mais tecnologia, com mais capacidade e também mais pessoas para operar, também temos de ter investimento e temos de ter um regulador que nos permita fazer estes investimentos e suportar estes custos", acrescenta Ana Loureiro, explicando que nesta área "não há concorrência", pois "estamos todos a falar de um bem comum".
E o lixo que não se recicla?
Em Portugal, há várias hipóteses para tentar 'salvar' o lixo do aterro.
Em Lisboa, Porto, Madeira e Açores há estações de valorização energética, onde o principal objetivo é "produzir energia". Mais ainda, obtém-se "escória que vai transformar-se em agregado que dá para construção rodoviária".
No país há ainda estações de tratamento mecânico e biológico que "recebem os resíduos indiferenciados e tentam salvar o máximo possível de embalagens". Nessas alturas são ainda produzidos "corretivos orgânicos e só depois, o que sobra disso, é que vai para aterro".
Por fim, o aterro, "aquilo que ninguém quer". "Todos nós temos como meta reduzir ao máximo aquilo que vai para aterro, é a última solução que deve ser utilizada", explica Ana Loureiro. No aterro produz-se biogás, "que é extraído" e com o que é "produzida energia elétrica".
"De todas as soluções é o fim de linha, tem sempre de haver por causa de acidentes, greves, confusões, desastres, avarias. É o sítio que sabemos que garante segurança no caso de alguma coisa falhar. É o fusível do sistema", esclarece.
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