Implosão do BES, ruído mediático e falta de união na luta contra a dureza da Direção-Geral da Concorrência Europeia. Eis, no olhar do antigo chairman do Banif, a receita para o desastre do banco.
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Luís Amado garante que a administração da qual fez parte fez tudo o que podia para salvar o banco, incluindo as várias versões do plano de restruturação chumbadas pela Direção-Geral de Concorrência Europeia, mas lamenta um conjunto de fatores que ditaram o fim da instituição. A implosão do BES foi um desses fatores porque "afetou as condições de pagamento da última tranche" dos 400 milhões injetados pelo Estado no banco, na forma de capital contingente (CoCos), que "criou alguma hesitação relativamente ao caminho a seguir".
Essa hesitação, explicou, refletiu a progressiva falta de coesão entre o Banif, o Governo, o Banco de Portugal e as autoridades europeias. Esse espírito de cooperação, que existiu "até 2014", veio, ainda por cima, na pior altura, quando essa "coesão entre os principais atores era fundamental" para lidar com a Direção-Geral de Concorrência Europeia (DGCOM), "um centro burocrático extremamente agressivo e que teve um preconceito de raiz contra o Banif que nunca abandonou e que levou até às últimas consequências".
Junte-se a isto a notícia da TVI que dava conta do fecho iminente do banco (e que terá causado uma corrida aos balcões que retirou milhões de euros dos cofres do banco) e discussão sobre o Banif durante a campanha eleitoral e o resultado é uma "tempestade perfeita", argumentou durante a audição na Comissão Parlamentar de Inquérito à resolução do Banif.
Esse aliás, foi um "erro gravíssimo para o país e os contribuintes", sustentou o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, já que não há banco que sobreviva a uma crise de confiança e reputação: "os rácios podem estar lá", disse, mas "por muito grande que seja o rácio não é possível aguentar a pressão de uma desconfiança tão grande como aquele que foi gerada pelo tema Banif"
Preço baixo mas "surpreende que alguém tenha querido comprar"
Amado confessa que o anterior processo de venda, que culminou sem sucesso na sexta-feira anterior ao anúncio de resolução, o surpreendeu, dado o desgaste de imagem sofrido pela instituição. De tal forma que o antigo governante até teve "dúvidas que surgissem propostas" e que, por isso, ficou "surpreendido que tivessem aparecido seis propostas e que quatro delas tivessem sido apreciadas". O processo, infrutífero porque nenhuma das propostas foi considerada válida, transformou-se, em 48 horas, numa resolução e venda de um Banif expurgado de maus ativos ao Santander por 150 milhões de euros (e que, segundo contas do Jornal de Negócios, representou um desconto de 75%), representou um "grau de destruição que não deixa de ser surpreendente", lamentou.
Amado ficou, assim, com "um sentimento de frustração, de morrer na praia", porque acredita que existia ainda a possibilidade salvar o banco, vendendo-o a privados, desde que a DGCOM aceitasse o plano de restruturação várias vezes refeito, e que respondia "à maioria dos requisitos".
Não sendo isso possível, haveria ainda outro caminho: a integração na Caixa Geral de Depósitos, uma solução que o atual Governo ainda ponderou mas que não chegou a ir para a frente - porque isso seria uma ajuda do Estado, não permitida pelas regras europeias.