Berlusconi sobreviveu a escândalos que "teriam acabado com a carreira de qualquer outro político"
Paulo Rangel considera que a morte de Silvio Berlusconi "vai levar a um reajustamento muito grande da política italiana".
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Paulo Rangel considera que Silvio Berlusconi foi um precursor do mediatismo que hoje em dia é possível observar em políticos como Donald Trump ou Jair Bolsonaro.
"Berlusconi mostrou logo nos anos 90, e depois na primeira década de 2000, algo que nós hoje vemos: no caso de líderes (...) como por exemplo Bolsonaro, vemos que, apesar de constantes acusações, há uma base de apoio que nunca deixa de manifestar."
"O mais impressionante", destaca Paulo Rangel em declarações à TSF, é que no caso de Berlusconi esteve envolvido em escândalos judiciais e da vida privada que "teriam acabado com a carreira de qualquer outro político".
"Portanto, nesse sentido, ele é de facto um prenúncio do que aquilo que aparece depois", nota o eurodeputado português.
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Para Paulo Rangel, o antigo primeiro-ministro italiano conseguiu aproveitar o marketing para benefício próprio. "Não há dúvida que ele antecipou claramente o movimento que hoje toda a gente compreende, mas que nos anos 90 estava longe de alcançar: uma política extremamente voltada para o marketing de uma figura carismática e popular, muito imune aos escândalos de todo o tipo, capaz de superar um eleitorado de centro-direita, e até direita às vezes mais vincada, e ao mesmo tempo ir buscar muita gente desiludida com a política. Isto é, criar uma espécie de esperança num projeto de rutura."
Além disso, depois da "operação mãos limpas" em Itália, que expôs redes de corrupção associadas à máfia e até ao Vaticano, Berlusconi "aproveitou a oportunidade para emergir com uma espécie de D. Sebastião".
Sílvio Berlusconi foi eurodeputado, entre 2019 e 2022, mas o social-democrata Paulo Rangel reconhece que privou pouco com o antigo primeiro-ministro italiano, já que este pouco ou nada foi ao Parlamento Europeu.
"Berlusconi no Parlamento Europeu apareceu muito pouco e sempre que apareceu, praticamente aparecia sempre acompanhado de televisões, nunca aparecia sozinho", conta Paulo Rangel. "Para além de ter faltado basicamente todas as reuniões, das poucas vezes que foi a plenários - e só a plenários - nem sequer interagia com os colegas. Ele próprio era uma figura, digamos, com a sua corte. Fez algumas aparições mediáticas, mas sem qualquer interação com os colegas."
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Estes anos ficaram também marcados por sucessivos internamentos: em 2019 o eurodeputado italiano foi operado devido a uma obstrução intestinal e em setembro de 2020 contraiu Covid-19 a que se seguiram hospitalizações associadas a várias sequelas da doença, como infeções respiratórias.
Apesar de já não ter um lugar de destaque na política ativa italiana, Sílvio Berlusconi ainda tinha influência no partido Forza Italia, que faz parte da coligação governamental em Itália. Paulo Rangel considera por isso que a morte do antigo primeiro-ministro italiano "vai levar a um reajustamento muito grande da política italiana", onde "os votos foram sempre essencialmente pessoais", considera.
Silvio Berlusconi morreu esta segunda-feira no hospital San Raffaele, em Milão, desde sexta-feira, na sequência de uma pneumonia derivada da leucemia de que sofria há vários anos. Tinha 86 anos.