Com um cardápio considerável de declarações racistas, homofóbicas, defensoras da ditadura militar e da tortura, quer acabar com a violência e com a corrupção. Faltou ao último debate presidencial na Globo por estar a convalescer do atentado de que foi alvo. Enquanto os oponentes debatiam, ele dava uma entrevista a uma outra televisão. Só. Sem contraditório. A falar para os seus, que já não são poucos. Bolsonaro lidera as sondagens.
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Há quem lhe chame mito, quem lhe chame nojo, quem fale de um fenómeno digital, quem o acuse de ser ignorante, quem veja nele o messias, quem o ame, quem o odeie. Jair Messias Bolsonaro é o candidato outsider - mesmo que já conte 27 anos como deputado do Congresso - que segue na frente das sondagens. Reclama a mudança do sistema depois de trinta anos dentro dele. O fim das benesses aos políticos quando delas sempre beneficiou.
Tem 63 anos, cinco filhos, três deles também na política - um depois de derrotar a própria mãe, ex-mulher de Jair, numa disputa eleitoral no Rio de Janeiro). Bolsonaro é um militar na reserva e nasceu no estado de São Paulo, mas tem vivido sempre entre Brasília, onde trabalha, e o Rio de Janeiro, onde vive a família. É lá que atualmente recupera da facada que o atirou para uma cama de hospital, mas que o fez subir nas sondagens.
E o que é que Bolsonaro tem? Tem resposta para tudo, mesmo quando não responde nada.
Desde logo, tem muito jeito para semear confusão. Ele é o candidato conotado com a extrema-direita. Concorre pelo PSL- Partido Social Liberal, o nono partido da sua carreira política.
Foi o atentado sofrido em setembro, quando fazia campanha em Juíz de Fora, no Estado de Minas Gerais, que fez disparar a popularidade, de 23 para 35% nas intenções de voto, deste homem que já se assumiu preconceituoso "com muito orgulho".
Bolsonaro foi apunhalado quando era levado em ombros pela multidão. O ataque perfurou-lhe o pulmão, intestinos e fígado. Saiu da rua, mas a campanha continuou nas redes sociais. Jair na cama debilitado, Jair na cadeira de rodas, os primeiros passos de Jair depois da operação. "Primeiro turno. Me aguardem."
Recuando uns anos. Jair Bolsonaro saiu do anonimato quando, em 1986, reclamou dos salários baixos dos militares, num artigo publicado na revista Veja. Foi preso por insubordinação e passou quinze dias atrás das grades. Um ano depois, ainda a pretexto dos salários baixos, torna-se suspeito de tentar fazer explodir bombas em unidades militares do Rio de Janeiro, como forma de pressão. O Conselho de Justificação Militar dita por unanimidade que é culpado. Recorre para o Superior Tribunal Militar e é absolvido.
Depois disto, prefere passar à reserva e abraçar a política: primeiro, como vereador no Rio de Janeiro, e em 1991 como eleito para a Câmara de Deputados.
Não tem trabalho que se veja como político, mas o número de declarações polémicas é elevado.
"Através do voto, você não vai mudar nada nesse país, absolutamente nada", dizia em 1999, com Fernando Henrique Cardoso na Presidência. "Só vai mudar, infelizmente, no dia em que partir para uma guerra civil e fazendo o trabalho que o regime militar não fez. Matando uns 30 mil, começando pelo FHC [sigla pela qual Fernando Henrique Cardoso é conhecido], não deixar ele pr'a fora, não. Matando! Se vão morrer alguns inocentes, tudo bem, tudo quanto é guerra morre inocente."
Seja orientação sexual, etnia ou género, é só googlar e as palavras de Bolsonaro fazem ricochete.
"Mulher deve ganhar menos porque engravida", em 2015; "Não te estupro porque você não merece", voltado para uma deputada do Partido dos Trabalhadores, em 2014; "Se eu vir dois homens na rua se beijando, vou bater", disse em 2002, sem nunca se ter retratado; "Afrodescendente...nem para procriador ele serve mais", em 2017, numa das muitas declarações de tom racista; "É melhor Jair se acostumando", em 2018.
Algum Brasil não só se acostumou, como até parece querer. Tudo indica que é a 28 de outubro, data da segunda volta da corrida presidencial, que se vai ficar a saber.