"Está a ocorrer o maior ataque aos poderes parlamentares sobre o Orçamento de que há memória"
Rui Tavares acusa o Governo de "esvaziar" os poderes dos deputados "com a passividade de PS e Chega". Para o Livre, os "cavaleiros orçamentais" que Miranda Sarmento quer retirar do Orçamento trouxeram "benefícios às pessoas"
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No debate orçamental, o Livre considera que há margem para avançar com propostas, apesar dos avisos de Miranda Sarmento de que a margem é próxima de zero?
Eu quero enfatizar isto porque acho que é um dos alertas mais importantes que nós podemos lançar para que os nossos concidadãos tenham disto de consciência. Eu acho que está a ocorrer agora o maior ataque aos poderes parlamentares sobre o orçamento de que há memória na política portuguesa. E digo isto, tenho uma boa relação com o Joaquim Miranda Sarmento, mas o governo de Luís Montenegro, com a passividade de PS e de Chega, estão a fazer uma coisa extraordinária. Este ano não dá jeito a novela orçamental, mas podemos esvaziar o orçamento, como estamos a fazer? Podemos admitir com Joaquim Miranda Sarmento que o orçamento seja um documento puramente técnico, que não tenha os chamados cavaleiros orçamentais?
António Costa também defendeu isso recentemente...
Pois, mas é claro, do ponto de vista do Executivo, o que é que o Executivo quer? Manietar o Parlamento e deixá-lo entre a espada e a parede, com um Orçamento puramente técnico, onde não há os tais cavaleiros orçamentais. Eu depois gostaria de explicar o que é que eles são, dar exemplos, porque dito assim, parecem uns cavaleiros orçamentais, parece que andam aí a galopar, muito sem destino. É preciso explicar o que é que são e o que é que fazem, o que é que fizeram, em benefício das pessoas. Mas depois, por outro lado, nós temos uma lei de travão, e nessa lei de travão o Parlamento não pode legislar durante o ano em coisas que tenham impacto orçamental. Portanto, um Parlamento que tem a lei de travão, e bem, mas por outro lado não pode intervir no orçamento, que é uma competência exclusiva da Assembleia da República, durante a especialidade, é um orçamento que é um Parlamento, peço desculpa, que não serve para nada daquilo que é historicamente o papel dos Parlamentos. Por isso que é o que eu estou a dizer. Estão-nos a tapar os olhos com burcas e com gritarias no Parlamento, e ninguém está a reparar que o nosso Parlamento está a ser esvaziado dos seus poderes hoje, num Parlamento que não tem uma maioria absoluta. Portanto, onde seria injustificável que isso acontecesse? Tem que haver algum partido que seja visto a lutar contra isto, e claramente não é a Iniciativa Liberal que, por pouco ou nada, serve nestas situações. O Livre desempenha esse papel. Então vou explicar o que é que são os cavaleiros orçamentais. O subsídio de desemprego para as vítimas de violência doméstica é a nossa primeira vitória orçamental, precisamente quando a Ana Mendes Godinho. Hoje nós sabemos que há vítimas de violência doméstica que podem quebrar o ciclo de violência, podem ter a sua independência financeira e iniciar uma vida nova, por causa daquilo a que Joaquim Miranda Sarmento chamaria um cavaleiro orçamental. O passe ferroviário verde, de que o Governo e gaba tanto, começa precisamente como um cavaleiro orçamental. Acho que toda a gente se lembra de eu inquirir Pedro Nuno Santos acerca disso e da necessidade de fazer um passe ferroviário que na altura chamava nacional. A majoração dos abonos de família para as famílias monoparentais, que ajudou tanto pai e mãe, solteiros, viúvos, divorciados, durante a explosão da inflação. Joaquim Miranda Sarmento chama-lhe um cavaleiro orçamental. Eu chamo-lhes cavaleiros andantes, como nas histórias, não é? Vêm em auxílio das famílias que estão em perigo. Vêm em auxílio das pessoas que estão entre a vida e a morte, no caso as vítimas de violência doméstica. Se nós tiramos isto de um orçamento, nós desistimos de um orçamento que ajuda as pessoas. E isso o Livre não aceita. Não há nenhuma abstenção exigente nos possa fazer esquecer isso e, portanto, com a mesma cordialidade com que falamos bem com os partidos à nossa volta, também lhes dizemos com muita franqueza, isto é um mau serviço prestado à política portuguesa, ao parlamento, ao parlamentarismo e à própria política orçamental. Não é assim que as coisas devem ser feitas e as pessoas andam a ser distraídas pelas burcas e burquinhas e não estão a reparar numa coisa que vai acabar por retirar do orçamento as coisas que lhes aumentaram o abono de família, que lhes deram um passo ferroviário mais barato ou que lhes permitiram refazer a sua vida e tantas outras que eu poderia dizer.
Espera que o PS esteja ao lado do Livre nesse combate?
Gostaria, mas não tenho esperança nenhuma. Não tenho esperança que o que aconteceu, talvez com o José Luís Carneiro seja diferente, é que à abstenção na generalidade corresponde o chumbo sequencial em tudo o que seja diferente na especialidade. E, portanto, vai haver ali um posicionamento de ora abstenção, ora voto contra, mas que na prática, depois feitas a matemática que eles lá vão fazer entre os três grandes partidos, vai significar chumbar todo este tipo de coisas e é por isso que eu estou aqui a alertar. Estas coisas, chamem-lhes cavaleiros orçamentais, eu chamo-lhes cavaleiros andantes, têm ajudado as pessoas, é aquilo que os nossos eleitos ainda podem fazer, porque se não, andamos a votar em eleições legislativas para deputados que podem fazer projetos de resolução, recomendações genéricas ao governo, porque têm a Lei Travão e, acho bem, para não haver descontrolo orçamental, para saber com o que é que se conta durante o ano, mas o contraponto de haver Lei Travão é que, na especialidade, o Parlamento pode alterar o orçamento. Ah, depois, se se considerar, que alterou demasiado, tem um voto final global para decidir como é que se posicionam. Se for preciso, fazem novo orçamento. Sem, espero eu, a espada de Dâmocles em cima de chumba o orçamento, vamos para eleições. É preciso levar a sério o processo de construção orçamental.