CPI à TAP: das críticas "infelizes" do ministro à "subserviência dos deputados"
O relatório preliminar da comissão parlamentar de inquérito à TAP e as críticas de Pedro Adão e Silva estiveram em debate na última edição de O Princípio da Incerteza.
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A deputada socialista Alexandra Leitão considera que, apesar tudo, foi melhor ter existido uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) à gestão política TAP do que não existir. A antiga ministra do PS considera que as declarações do ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, sobre os trabalhos da CPI à TAP foram "infelizes" e "contribuíram muito pouco para a saúde das instituições democráticas".
Em entrevista à TSF e ao Jornal de Notícias este domingo, o ministro condenou o que diz ser uma "degradação do ambiente político" em Portugal e comparou os deputados da CPI com "uma espécie de procuradores do cinema americano de série B da década de 80".
"Foram declarações infelizes para um ministro da República", afirma Alexandra Leitão no programa da TSF e CNN Portugal O Princípio da Incerteza. "Não sei se referia apenas aos deputados da oposição ou também aos deputados do seu partido."
"Acho que são declarações que um ministro da República não faria se não tivesse maioria absoluta, o que também nos deve levar a pensar. E diria mesmo que muitas das circunstâncias mais complexas que aconteceram na comissão, enfim, foram proporcionadas por eventos que aconteceram no quadro do próprio Governo", nota.
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Alexandra Leitão manifestou ainda solidariedade para com a indignação do presidente da CPI, António Lacerda Sales, que já pediu ao ministro da Cultura para se retratar.
Sobre o relatório preliminar da CPI à TAP, que iliba o Governo do valor da indemnização paga a Alexandra Reis, bem como de interferência na gestão da companhia aérea, Alexandra Leitão admite que "poderia ser um pouco mais valorativo na parte das conclusões", mas considera que "na factualidade está muito rigoroso e nas recomendações muito eloquente".
"Acho que nesta comissão não houve tantos "não me lembro" ou "não me recordo" como noutras comissões a que já assisti", aponta Alexandra Leitão. "E dito acho que foi melhor haver do que não haver" uma comissão de inquérito à TAP. "A transparência e a fiscalização que a Assembleia deve fazer sobre a atuação do Governo saem sempre fortalecidas pela existência de uma comissão de inquérito."
A deputada socialista concorda ainda com a decisão de não incluir o episódio que teve como protagonista o ex-adjunto de João Galamba, Frederico Pinheiro, nas conclusões do relatório, "por não caber no objeto, sem prejuízo a relevância política".
Por sua vez, José Pacheco Pereira diz não ter ficado surpreendido pelo facto de o relatório proteger o Governo e considera que "a qualidade da comissão foi baixa".
"Houve uma grande subserviência dos deputados em relação aos incidentes e mesmo perguntas que tinha todo o sentido serem feitas - até sobre os acontecimentos com o assessor - nunca foram feitas."
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Ao contrário de Alexandra Leitão, o historiador defende que os incidentes no Ministério das Infraestruturas deviam também constar no documento, ainda que não fizesse sentido serem "o centro do relatório".
"É muito difícil compreender o que é que estava naquele computador que explicou aquele conflito", incluindo agressões entre várias pessoas no ministério. "O que é que no computador estava que justifique essa cena? Não é aquilo que as pessoas dizem que está. E, portanto, eu continuo a não saber muita coisa."
Pacheco Pereira ressalva que é preciso aguardar as conclusões da Polícia Judiciária sobre o caso. "Espero que a Polícia Judiciária faça um bom trabalho, que vai ser também muito interessante ver se existe contradição entre aquilo que vai ser o trabalho da Polícia Judiciária e aquilo que foi o adquirido na comunicação social e por alguns deputados na comissão."
Também António Lobo Xavier não esperava um documento com críticas ao Governo. "Eu não tinha uma esperança de um texto magnífico e lindo, imparcial, mas estava à espera de um mínimo de dignidade", acusa.
"Aceito que, ao contrário do que aconteceu noutras comissões de inquérito, havia aqui uma espécie de anticlímax que era a responsabilidade política ou, se quiser, as consequências políticas dos erros na gestão da TAP tinham sido assumidas com a demissão do ministro das Infraestruturas e do Secretário de Estado. Portanto, do ponto de vista das responsabilidades políticas, a questão estava resolvida, mas por a questão estar resolvida desse ponto de vista, não quer dizer que um relatório de uma comissão omita qualquer referência às responsabilidades."
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O antigo dirigente do CDS defende que o relatório desconsidera tudo aquilo a que a opinião publica assistiu nos últimos tempos, a começar pelas demissões do antigo ministro Pedro Nuno Santos e do secretário de Estado das infraestruturas Hugo Mendes.
"O que é que a opinião pública viu? Viu a crise política talvez mais importante dos últimos tempos, com a demissão de um ministro e de um secretário de Estado. Isso é incontornável, aconteceu aos olhos de toda a gente", considera.
Para António Lobo Xavier, Pedro Nuno Santos e Hugo Mendes "consideraram que se iam embora, apesar de quererem muito o poder no presente e no futuro e, portanto, alguma coisa política havia por trás disso. E nós fomos sabendo o que era: em primeiro lugar terem dito que não sabiam de nada e pedido até formalmente, por despachos, esclarecimentos à gestão da TAP, vindo-se depois a verificar que sabiam de tudo e tinham autorizado".
"Vimos o caos administrativo, um caos de informalidade, de não cumprirem as regras legais, de não passarem à forma expressa as coisas básicas do relacionamento de acionistas com empresa e da própria vida da empresa; vimos o caos no gabinete do atual ministro das Infraestruturas, um caos administrativo que se estende até a própria classificação dos documentos e até a própria partilha e guarda de documentos confidenciais e, portanto, o caso tinha dimensões óbvias que foram passadas para a opinião pública, a que opinião pública assistiu, e este relatório preliminar olimpicamente ignora isto", condena.