JMJ: "Não há qualquer problema de inconstitucionalidade" no perdão e amnistia para jovens

Maria de Oliveira Martins
Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa
A constitucionalista Maria de Oliveira Martins defende a proposta de lei que prevê perdão e amnistia para jovens a propósito da vinda do Papa a Portugal.
Maria de Oliveira Martins, professora auxiliar na Faculdade de Direito da Universidade Católica, onde leciona Direito Constitucional, defende que "não há qualquer problema de inconstitucionalidade" no perdão de penas e amnistia de crimes praticados por jovens entre os 16 e 30 anos até ao dia 19 de junho de 2023.
A proposta de lei apresentada pelo Governo não abrange crimes graves e foi aprovada em Conselho de Ministros extraordinário no âmbito da vinda do Papa Francisco a Portugal, para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), na primeira semana de agosto.
Em declarações à TSF esta segunda-feira, Maria de Oliveira Martins considera que a amnistia "é uma medida por natureza discricionária", pelo que não faz sentido defender que coloca em causa o princípio da igualdade por abranger apenas jovens, como defende o constitucionalista Vitalino Canas.
"Olhando ao histórico das amnistias em Portugal, a verdade é que tem havido amnistia de grupos específicos de pessoas e o Tribunal Constitucional nunca levantou problemas em relação a isso. Porquê? Porque a amnistia não é um direito, é uma medida de clemência que pode ser assumida pela Assembleia da República."
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Para a especialista em Direito Constitucional, a proposta também não viola o princípio de laicidade do Estado, apesar de se inserir no quadro da JMJ e vinda do Papa a Portugal.
Já "houve algumas amnistias motivadas por algumas visitas papais", mas "não constitui um direito, não é uma prerrogativa do Papa, portanto, não há aqui nenhuma ingerência da Igreja na vida do Estado", aponta. "É o Governo que, a propósito deste evento" decide fazer uma amnistia.
O diploma aprovado em Conselho de Ministros em junho estabelece o perdão de um ano para todas as penas até oito anos de prisão, sendo adicionalmente fixado um regime de amnistia que compreende as contraordenações cujo limite máximo de coima aplicável não exceda 1000 euros e as infrações penais cuja pena não seja superior a um ano de prisão ou a 120 dias de pena de multa.
Estão excluídos crimes de homicídio, de infanticídio, de violência doméstica, de maus-tratos, de ofensa grave à integridade física, de mutilação genital feminina, de ofensa à integridade física qualificada, de casamento forçado, de sequestro, contra a liberdade e autodeterminação sexual, de extorsão, de discriminação e incitamento ao ódio e à violência, de tráfico de influência, de branqueamento ou de corrupção, bem como crimes rodoviários, nomeadamente condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, e também, no âmbito das contraordenações, as que forem praticadas sob influência de álcool ou de drogas.
A proposta de lei, a submeter à Assembleia da República, já foi apresentada para parecer ao Conselho Superior do Ministério Público, que afirma que o documento merece ponderação, sem nunca referir que é inconstitucional.