"Ninguém é culpado até ser condenado." Marques Lopes defende que políticos devem manter "sangue frio"
À TSF, o comentador considera que buscas em São Bento podem significar duas coisas: ou um "problema sistémico", ou um passo da justiça "sem certeza do que está a fazer".
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As buscas no Ministério do Ambiente e na residência oficial do primeiro-ministro, em São Bento, esta terça-feira, levaram os partidos a exigir respostas de António Costa, ou mesmo a demissão. No entanto, para o comentador de política Pedro Marques Lopes, a possível demissão de Costa significa transferir para o Ministério Público a governação do país e, por isso, pede "muito sangue frio" aos políticos.
"Tenho de confessar a minha estranheza. (...) Acho que é a primeira vez na história da nossa democracia que a residência oficial do primeiro-ministro é alvo de buscas", começa por afirmar, em declarações à TSF, Pedro Marques Lopes.
"Ou de facto a justiça sabe muito bem o que se está a passar e temos um problema sistémico, ou a justiça não mediu bem o seu passo e também temos um problema gigante, que é a justiça fazer uma coisa desta dimensão sem indícios suficientes e certeza do que está a fazer", acrescenta.
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Pedro Marques Lopes reforça os princípios básicos do Estado de Direito, que, afirma, são muitas vezes esquecidos nestas ocasiões: "Ninguém é culpado até ser condenado."
"Se o primeiro-ministro se demitir em função de um processo que está a investigação, tínhamos neste momento transferido para o Ministério Público a governação do país, que tinha a capacidade de mandar abaixo um Governo apenas como uma investigação", explica.
"O Estado de direito é muito mais do que isso", reitera o comentador.
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Perante uma situação que considera ser "gravíssima", Pedro Marques Lopes afirma que a oposição deve manter a calma e "esperar pelo aquilo que a justiça vai dizer e pelos próximos acontecimentos".
"Acho que é altura de os políticos terem muito sangue-frio, muito juízo e perceber que isto pode implodir com as bases do sistema", conclui.
Já na perspetiva do professor de ciência política da Universidade do Minho José Palmeira, há "uma fragilização" de Costa que, "embora não esteja diretamente envolvido, é responsável pelas escolhas que faz o chefe de gabinete".
O primeiro-ministro "deverá tirar consequências políticas", defende, esclarecendo que a demissão depende se a investigação ser ou não "de uma magnitude máxima".
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Também ouvido pela TSF, o politólogo António Costa Pinto acredita que o país está perante "a conjuntura clássica onde há dois atores centrais: o primeiro-ministro e o Presidente da República".
Foram detidos esta terça-feira o chefe de gabinete de António Costa, Vítor Escária, um consultor próximo do primeiro-ministro, Diogo Lacerda Machado, o presidente da câmara municipal de Sines, o socialista Nuno Mascarenhas, e dois executivos de empresas, na sequência de uma operação de buscas em vários ministérios e em São Bento.
A operação deve-se a uma investigação sobre os negócios do lítio, em Montalegre, e como tal, o Ministério Público confirma que João Galamba e o Presidente do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente foram também constituídos arguidos.
Questionado sobre o envolvimento do ministro das Infraestruturas, António Costa Pinto não tem dúvidas: "Evidente comportaria uma enorme ironia se, após o que aconteceu, Galamba fosse eventualmente acusado neste processo".
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A Procuradoria-Geral da República avança esta terça-feira que se verificam "os perigos de fuga, de continuação de atividade criminosa, de perturbação do inquérito e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas".
"Os detidos vão ser presentes a primeiro interrogatório judicial para aplicação das medidas de coação", refere ainda em comunicado, acrescentando: "Em causa poderão estar, designadamente, factos suscetíveis de constituir crimes de prevaricação, de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência".
A investigação visa as concessões de exploração de lítio nas minas do Romano (Montalegre) e do Barroso (Boticas), um projeto de central de produção de energia a partir de hidrogénio em Sines e o projeto de construção de "data center" desenvolvido na Zona Industrial e Logística de Sines pela sociedade "Start Campus".
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