"Não faz parte do objeto da comissão." Relatório deixa de fora polémica nas Infraestruturas
O documento que tem como relatora a deputada socialista Ana Paula Bernardo, foi entregue perto da meia-noite desta quarta-feira e descarta ingerência política.
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A deputada do PS Ana Paulo Bernardo, autora do relatório, começou por sublinhar que este texto é uma versão preliminar da comissão parlamentar de inquérito à gestão da TAP (CPI) e por esclarecer que é sobre a empresa, não "um diário" da CPI.
"Importa ter presente que foi esse o mandato e a missão que nos foi dada com a aprovação da resolução da Assembleia da República. O que esteve na origem desta comissão de inquérito foi um caso específico da atribuição de uma indemnização de 500 mil euros a um membro da comissão executiva da TAP na sequência da renúncia por acordo. Foi um facto que gerou uma enorme contestação política e social. Quisemos perceber como é que o Estado, enquanto acionista, exercia as suas responsabilidades e missões na empresa", esclareceu Ana Paula Bernardo.
Antes de apresentar as 75 conclusões do relatório, a deputada sublinhou que a opção da comissão foi realizar uma "análise retrospetiva" e esclareceu que alguns assuntos não fazem parte do relatório porque "a sua leitura deve ser feita nas sedes adequadas, como é o caso da polémica no Ministério das Infraestruturas, que não foi analisada.
"Ao longo dos trabalhos da TAP fomos tendo discussões sobre um conjunto de acontecimentos que foram debatidos e analisados, mas não dizem respeito, diretamente, ao objeto da TAP nem são da competência de uma comissão de inquérito. Como os incidentes ocorridos no Ministério das Infraestruturas. O caso já foi remetido para as entidades policiais relevantes, do qual resultou a abertura de um inquérito no Ministério Público. Noutro momento, a intervenção do SIS com vista à recuperação do computador", explicou a deputada do PS.
Sobre este último assunto, a socialista afirmou que a própria Assembleia da República já realizou um "conjunto de diligências" sobre o esclarecimento deste assunto.
"Já acompanhou a situação e avaliação feita pelo próprio investigador do SIRP. Sobre reunião decorrida em janeiro com a então CEO da TAP e um deputado do PS, anterior à constituição desta CPI, a comissão remeteu a questão para a 14.ª comissão, que é a competente para o efeito e essa comissão também já emitiu a respetiva deliberação", justificou.
Relativamente à tutela financeira, Ana Paula Bernardo explicou que as Finanças "não foram envolvidas neste processo". "Souberam no final quando houve a comunicação da TAP à CMVM", afirmou.
A deputada do PS indicou ainda que "não há evidências de qualquer relação entre a saída de Alexandra Reis da TAP em fevereiro" e a sua passagem para a NAV.
"A passagem de Alexandra Reis para a NAV foi uma nomeação que seguiu os trâmites legais e esperados", sublinhou.
Ana Paula Bernardo frisou ainda que "não houve registo de evidências de práticas de ingerência política" na gestão da TAP.
"Alternativa do Estado foi avançar com um auxílio"
Ana Paula Bernardo afirmou que, num momento em que a resposta de emergência para salvar a empresa não veio dos privados, que assumiram que não tinham disponibilidade para "injetar as verbas necessárias", a alternativa foi avançar com a ajuda estatal. Descartando também a hipótese de ingerência política.
"A alternativa do Estado foi avançar com um auxílio e com tudo o que isso implica em momentos posteriores, nomeadamente no entendimento relativamente a um plano de reestruturação que teve impactos muito complexos ao nível dos trabalhadores, com um número muito significativo de despedimentos e cortes salariais", reconheceu Ana Paula Bernardo.
Por fim, salientou que o papel da comissão é "potenciar melhorias" e, por isso, deixou "algumas recomendações como a necessidade de uma maior transparência e da forma como cada um dos administradores se deve relacionar com as tutelas e responsabilidades do Governo.
"Foi, em grosso modo, esta a configuração do relatório. Esta é uma versão provisória do documento. Como relatora, entendi que deviam ser transpostos para o relatório dos trabalhos desta comissão parlamentar de inquérito. Agora vai começar uma fase extremamente importante, de análise por parte dos diferentes membros da comissão e grupos parlamentares, obtenção das propostas de alteração e eventuais propostas que possam servir para melhorar e esclarecer algumas situações que possam não estar suficientemente claras neste documento", concluiu.
"Existem situações identificadas de intervenções do Estado menos felizes"
Questionada pelos jornalistas, Ana Paula Bernardo defendeu que, no relatório, "existem situações identificadas de intervenções do Estado menos felizes, que também merecem ser equacionadas no futuro", nomeadamente, "melhor articulação entre tutelas" e "reconhecimento, por parte dos membros do Governo, que em determinado momento estiveram menos bem".
A deputada do PS insistiu que "não houve evidências de ingerência das tutelas na gestão da TAP". Ana Paula Bernardo deu o exemplo do voo de Marcelo: "O Governo reconhece que a resposta não deveria ter sido aquela, mas em nada interferiu com a resposta final da TAP", disse.
Relativamente à não inclusão do episódio do Ministério das Infraestruturas, Ana Paula Bernardo afirmou que não se trata de "desvalorizar ou querer ignorar a situação". "A opção que assumi é que, sendo casos que não são objeto desta CPI, este acontecimento já tem aberto um processo judicial e encontra-se a seguir os trâmites normais."
A deputada do PS esclareceu ainda que as Finanças não tiveram "qualquer conhecimento" da indemnização a Alexandra Reis. "As Infraestruturas conheciam o valor, mas não houve informação dos termos em que esse valor estava a ser discutido", afirmou.
"Não é querer desresponsabilizar [Pedro Nuno Santos], é apresentar factos que levam a que as conclusões sejam estas", referiu.
Ana Paula Bernardo afirmou ainda que "sob a tutela pública - e contrariamente ao que alguns pretenderam fazer passar - [...] o único caso na tutela pública da empresa pública TAP apurado foi o [da indemnização] de Alexandra Reis e é uma situação que já se encontra corrigida".
"Esta não é uma versão do PS"
Questionada sobre se esta versão do relatório respeita a posição do PS, Ana Paula Bernardo nega, esclarecendo que o documento procura transmitir um "conjunto de factos apurados", "documentos analisados" e extrair um conjunto de conclusões.
"As conclusões que são retiradas encontram tradução nos factos apresentados. Não sei qual será o relatório final, que irá incorporar de propostas de outros grupos parlamentares, mas esta não é uma versão do PS", garantiu Ana Paula Bernardo.
Recuando a 2015, a deputada do PS afirmou que a comissão, desde cedo, compreendeu que para explicar os anos mais recentes de 2020 e 2022 precisaria de perceber um "conjunto de decisões e intervenções" que tinham sido tomadas nos anos imediatamente anteriores.
"Os factos que mais marcaram a vida da TAP nos últimos anos foram estes três: a privatização em 2015, a recompra em 2016/2017 e esta parte final de 2020. Este capítulo é um período com imensa informação e em que não somos os primeiros em trabalhar nestes dossiers. Temos, inclusive, decisões judiciais relativamente a alguns negócios que a empresa fez neste período que nos apoiaram naquilo que foi a nossa análise e nos dispensaram de aprofundamentos que já tinham sido feitos. Mas não é a única crítica. Se olhar para o período seguinte há a crítica de o Estado continuar a assumir riscos significativos na TAP e não manter direitos económicos", referiu a deputada do PS.
Relativamente à exclusão do caso das secretas e da reunião, a socialista argumenta que entendeu serem matérias que, "pela sua sensibilidade e porque existem sedes próprias", não competiria à comissão de inquérito da TAP procurar definir factos e conclusões.
"São questões sensíveis para o país e existem sedes específicas para o fazer. No caso da reunião, não tinha haver com o objeto da TAP no sentido em que ocorreu num momento anterior. O entendimento da comissão foi solicitar um esclarecimento da situação e, nesse sentido, entendi que o assunto estaria resolvido e não teve qualquer interferência nos trabalhos da CPI nem na forma como o deputado ou o PS conduziram os seus trabalhos em termos da CPI", justificou.
Questionada sobre se foram retiradas algumas lições para a privatização da TAP, Ana Paula Bernardo considerou que "há um conjunto de reflexões e pistas que devem ser tidas em conta no quadro de uma preparação de uma futura reprivatização da TAP".
"Não compete à CPI estar a definir orientações para o momento seguinte", acrescentou.
A deputada socialista reforçou que esta é "uma versão provisória" do relatório. "Da versão provisória à versão final poderão existir alterações substantivas e será sobre esse relatório final que os diferentes partidos irão definir os seus sentidos de voto", sublinhou.
Ministério Público? "Veremos se surge alguma informação que justifique esse envio"
Ana Paula Bernardo acrescentou que há alguns elementos que foram enviados ao Ministério Público, nomeadamente o despacho do processo de privatização. "Até ao final veremos se surge alguma informação que justifique esse envio" para o Ministério Público", assinalou.
Sobre a legalidade do uso dos Fundos Airbus, Ana Paula Bernardo reconheceu que a CPI "evitou tirar conclusões sobre o tema", uma vez que "está em curso uma investigação do Ministério Público e uma nova auditoria do Tribunal de Contas que irá averiguar o tema".
O relatório preliminar da Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão da TAP é apresentado, esta quarta-feira, no Parlamento. O documento foi entregue perto da meia-noite a versão preliminar de quase 200 páginas iliba o Governo do valor da indemnização paga a Alexandra Reis, bem como de interferência na gestão, e ignora o episódio com adjunto Frederico Pinheiro, apesar de deixar uma recomendação sobre segurança e "classificação de documentos".
Este relatório preliminar tem como autora a deputada socialista Ana Paula Bernardo.