Juliana Kerexu, coordenadora da Comissão do povo Guarani Yvyrupa, subscreve críticas aos negacionistas deixadas pelo Presidente do Brasil, Lula da Silva, e pela ministra dos Direitos Humanos e Cidadãos, Macaé Evaristo, no primeiro dia de COP30
Juliana Kerexu, coordenadora da Comissão do povo Guarani Yvyrupa, está entre os mais de três mil líderes indígenas que estão na Cimeira do Clima para reivindicar direitos e definir prioridades numa outra reunião paralela: a Cúpula dos Povos. Prevista para os próximos três dias, dentro do recinto do Parque da Cidade, ou Aldeia da COP, como já é conhecida.
Lula da Silva deixou críticas aos negacionistas das alterações climáticas, interpretadas por muitos como sendo dirigidas ao Presidente norte-americano, Donald Trump, no seu discurso oficial de abertura da COP30, em Belém do Pará. Na mesma ocasião, a ministra dos Direitos Humanos e dos Cidadãos do Brasil, Macaé Evaristo, durante uma visita ao recinto, fez saber aos jornalistas presentes, que o mundo atingiu um ponto em que a escolha já não é entre quem sobreviverá e quem vai morrer com o impacto das alterações climáticas.
"Mesmo que queiram, já não há diferenciação entre os impactos sentidos por ricos e os sentidos pelos pobres, porque os fenómenos climáticos extremos afetam todos e isso está à vista, basta olhar para o rasto de destruição deste último tornado que deixou mais de 400 feridos e seis mortos no estado do Paraná", denuncia.
Desafiada a reagir pela TSF, Juliana Kerexu subscreve a ideia dos governantes. Confessa que há muitos anos que se sentem as alterações climáticas nas aldeias, onde estes povos indígenas habitam em plena floresta, desde o sul do Brasil, ao Paraguai, Argentina e Bolívia. Em especial na época das chuvas, entre novembro e março, o aumento da quantidade e duração das tempestades tem provado que o impacto climático é um facto.
Ora, na cimeira onde o índio quer saber o que estão a fazer os outros povos para que o céu não caia em cima de quem vive na Amazónia, a representante dos Guarani lamenta que muitas pessoas ainda estejam em negação sobre as alterações climáticas, apesar de viverem com elas.
"As pessoas que não estão a sofrer com isto vão continuando a escolher lados. Só que não existem lados. A gente não tem um planeta B. Temos, sim, um planeta que estamos dividindo por todos e em todo mundo. Se esse planeta morrer, todos nós morremos, independentemente se é mais rico, se é mais pobre. Só que, infelizmente, hoje, os mais pobres estão passando por isso. Estão enfrentando muito mais do que essas pessoas que vivem em grandes cidades e que ainda não estão 'sentindo'. Apesar de já viverem com as alterações climáticas, ainda há essa negação", reconhece.
O agravamento das condições climáticas na Amazónia é já uma realidade que esta representante do povo Guarani constata nos contactos que faz no terreno pelas diversas aldeias. "A gente das aldeias indígenas, com quem lidamos muito, desde a terra, até à questão espiritual, verificamos que as nossas comunidades estão sendo zonas de impactos e há muito mais tempo do que está sendo percebido agora. Os Guarani já sentem isso há anos. Por isso, há muitos anos que tentamos trazer para a discussão principal a emergência climática, porque a realidade mostra que as mudanças climáticas estão aí. Por exemplo, a enchente do Rio Grande do Sul e o tornado no estado do Paraná, que devastou uma cidade inteira. Então, tudo isso é um reflexo daquilo que já tem acontecido e que a gente tem falado há muito tempo", avisa.
Ao lado de cerca de três mil lideres de 28 comunidades indígenas vão realizar a Cúpula dos Povos, para delinear estratégicas de atuação, em paralelo com uma cimeira, em que o Brasil lançou o chamado Fundo Para as Florestas Sempre, e para o qual o Presidente Lula já fez saber que conseguiu os primeiros cinco milhões de dólares de países doadores, presentes na COP30.
Para Ju, como lhe chamam os companheiros da comunidade, esse é um bom caminho, pela comunidade internacional reconhecer o papel do índio na preservação da floresta, com todo o seu conhecimento ancestral, mas é preciso também que saia desta cimeira o reconhecimento ao direito da demarcação territorial.
Para reclamar justiça climática, esta e outras comunidades vão participar na flotilha de 200 barcos indígenas, liderados pelo Rainbow Warrior do Greenpeace, na descida do rio Amazonas, na próxima quarta-feira, numa chamada de atenção para os problemas climáticos da Amazónia.
A Cúpula dos Povos Indígenas é ainda apoiada por vários outros movimentos ambientalistas, o que está a criar expetativa quanto à participação de todos na tradicional marcha pelo clima, que se tem realizado em cada cimeira da ONU desta natureza e desta vez, está marcada para o próximo sábado.