Opinião

Regras e ordem. O combate de Ventura contra os cravos

Artur Machado

Os debates presidenciais têm sido interessantes de seguir. Os meus favoritos são aqueles em que participa André Ventura. Desde logo porque, sempre que fala, parece que estou a ouvir o discurso de uma candidata a miss qualquer coisa. Não pelo conteúdo, uma vez que as misses se limitam a pedir a paz no mundo, enquanto Ventura quer limpar Portugal, a Europa e o mundo de corruptos, de imigrantes e, ultimamente, de cidadãos do Bangladesh. Mas, à semelhança das candidatas a miss, o líder da direita radical populista repete ideias simples, capazes de emocionar o mais empedernido abstencionista. Para citar uma frase muito repetida pelo líder do Chega, a "conversa da treta" é sempre a mesma.

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Por exemplo, a preocupação com a corrupção é tão grande que, nestes 50 anos de democracia, só descortina uma grande mudança, repetida três vezes, no debate com Marques Mendes: corrupção, corrupção, corrupção. Mendes tentou enlamear o debate, atacando o currículo de um dos deputados do Chega, aquele que foi apanhado a roubar malas nos aeroportos. Mas Ventura não se deixou ficar, e cito: "Há 50 anos que vocês andam a roubar malas cheias de dinheiro". Incluindo, portanto, o adversário que tinha à sua frente, no saque democrático. Mendes nem tentou rebater o argumento. Compreende-se. No tempo em que havia conversas de café, quando um cliente mais exaltado proferia determinado tipo de sentenças, a determinadas horas da noite, o mais prudente era ficar calado.

Mas há outras qualidades de Ventura que merecem destaque. Gosta de ordem e de regras. Que trata de impor, "contra tudo e contra todos" e, simultaneamente, "de olhos nos olhos", duas expressões sempre presentes no seu discurso tão original. Destaco a cena que ocorreu na Assembleia da República, e na forma como a contou o nosso herói, no referido debate, com uma emoção que poderia bem ser a de quem está a falar de uma operação de limpeza no Bairro da Jamaica, ou num acampamento cigano.

Pois não é que um provocador espalhou cravos vermelhos no Parlamento, no preciso dia em que se comemoravam os 50 anos do 25 de novembro? Como bem lembrou o candidato, um ato que vai contra todas as regras, porque aquele, note-se, era um dia para rosas brancas. E quando é preciso "impor a ordem e as regras", ninguém o faz com a coragem de Ventura. Tal como o polícia arremete contra os criminosos, que, ou são imigrantes, ciganos, ou políticos, Ventura arrancou os cravos desse local sagrado. Não há flores revolucionárias que o impeçam de "cortar a direito", outra das suas frases originais.

Para citar Camões, um tipo que tinha jeito para a épica, "ditosa pátria que tal filho teve". É certo que o poeta se referia ao Condestável e à vitória sobre os castelhanos em Aljubarrota, mas a comparação não é descabida. Também Ventura é destemido, também ele não tolera "traições à pátria", e muito menos a ameaça de perigosos "esquerdalhos" armados com cravos.

Rafael Barbosa