
Empresa Neoépica
Os peritos descrevem os vestígios encontrados na freguesia da Ajuda como a "estação arqueológica pré-histórica mais importante até agora escavada em Lisboa". Para preservar o tesouro com mais de cinco mil anos, foi lançado o movimento cívico "Aqui nasceu Lisboa"
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O terreno, na Travessa das Dores, na freguesia da Ajuda, em Lisboa, está vedado e parece abandonado. Do exterior, veem-se pequenos muros, mas não são estes muros que entusiasmam os arqueólogos. O tesouro maior está debaixo de terra, o que acaba por ser uma protecção para ruínas que datam do final do Neolítico e do Calcolítico, ou seja, com mais de cinco mil anos.
A partir de sondagens arqueológicas, uma equipa de peritos da empresa Neoépica descobriu o "sítio mais importante da pré-História recente" do concelho de Lisboa. O arqueólogo Nuno Neto, que coordenou as escavações em conjunto com Paulo Rebelo e Miguel Rocha, afirma que, além de uma "enorme plataforma com imensos silos, para guardar cereais", foram descobertos fossos que serviam para defender os silos.

O arqueólogo João Luís Cardoso, que colaborou na publicação dos achados, não tem dúvidas de que estamos "perante a estação arqueológica pré-histórica mais importante até agora escavada em Lisboa". É o "celeiro da Travessa das Dores", na freguesia da Ajuda, ao qual se acrescentam os vestígios encontrados nas escavações do Rio Seco.
O resultado é "uma situação única, mesmo a nível internacional", destaca João Luís Cardoso, tendo em conta "a associação de hortas, delimitadas por muros, com talhões agrícolas em meio urbano". Apesar das construções na cidade, os vestígios "não só não foram destruídos, mas foram identificados e escavados". Contudo, salienta João Luís Cardoso, "o difícil em arqueologia não é escavar, é preservar".

Uma parte das ruínas está sob um bloco de apartamentos que foi construído há cerca de dez anos. Para as proteger, as ruínas foram cobertas com uma manta geotêxtil e cascalho, mas estão soterradas e longe da vista. O mesmo poderá acontecer a outra parte do complexo pré-histórico, uma situação que perturbou Álvaro Dias.
Apaixonado por arqueologia, o professor universitário descobriu o celeiro pré-histórico numa visita guiada pela freguesia onde reside e, face ao risco de destruição das ruínas, decidiu "não ficar sentado no sofá". Criou um movimento cívico, para preservar o património arqueológico, mas quer também dinamizar outros espaços da freguesia da Ajuda. O projecto "Aqui nasceu Lisboa" inclui a abertura de um centro de interpretação, a revitalização do mercado local e o aproveitamento das grutas do Rio Seco para visitas ou concertos, num programa direccionado a turistas culturais. Álvaro Dias realça que não se pretende "estragar a freguesia" com turismo de massa, mas promover uma "Lisboa mais autêntica, ligada às origens".
O projecto, pensado para sete anos, está a dar os primeiros passos. O site aquinasceulisboa.pt foi lançado recentemente, para "ajudar o património a ver a luz do dia e ser valorizado", refere Álvaro Dias, que convida os interessados na "boa causa" a registarem-se aqui.
*A autora escreve de acordo com o antigo acordo ortográfico.