Preocupação, surpresa, e estranheza são os termos que Carlos Moedas utiliza para classificar o resultado dos dois contactos que teve com Ricardo Salgado, uma única reunião e um telefonema. Os termos constam da carta em que responde às perguntas colocadas pelos deputados da Comissão Parlamentar de Inquérito.
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Carlos Moedas garante que só teve conhecimento das dificuldades no Banco Espírito Santo (BES) e Grupo Espírito Santo (GES) nessa única reunião com Ricardo Salgado a 2 de maio do ano passado, quinze dias antes do fim do programa de ajustamento.
O antigo secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro reconhece que receou implicações do problema do GES na saída limpa do programa da troika. Foi nesse momento que soube também da exposição excessiva do BES ao GES. Tudo o resto, garante que só soube pela comunicação social.
A todas as perguntas concretas sobre o grau de conhecimento em relação ao problema, Moedas responde, invariavelmente, que soube pela imprensa. Nunca teve informações relativas à exposição bancária, à concentração de fundos, a contas de resultados e aumentos de capital.
O tema não foi abordado a nível político por ele e não se a troika fez perguntas sobre os problemas no BES. E apesar de ser adjunto do primeiro-ministro, também diz que não sabe se o Governo português revelou aos credores preocupações sobre a situação no banco.
Cerca de um mês depois de ter recebido Ricardo Salgado - não por especial favor, mas porque, diz, sempre recebeu personalidades da sociedade portuguesa -, Moedas confirma que recebeu a 2 de junho um telefonema.
Uma insistência de Ricardo Salgado, com dois pedidos que o deixaram surpreendido. Salgado pediu-lhe que Moedas interviesse em nome do Grupo Espírito Santo e que fizesse dois contactos.
Um, para o Ministro da Justiça do Luxemburgo, um luso descendente que Moedas conhecia. Salgado pediu-lhe que falasse com ele por causa dos problemas jurídicos do GES no Luxemburgo.
Outro, que conseguisse marcar uma reunião de Salgado com o presidente da Caixa Geral de Depósitos, José de Matos. Surpreendido com os pedidos, Moedas assegura aos Deputados que não fez qualquer contacto para o Luxemburgo.
Já quanto ao segundo pedido, chegou a comentar aquele telefonema com o presidente da CGD, mas sublinha que não deu quaisquer instruções para que José de Matos recebesse Salgado.
O atual comissário Europeu desabafa que na sequência deste telefonema percebeu que «a situação era mais preocupante do que se supunha».
Nas reuniões do Conselho Superior do GES, gravadas e entretanto tornadas públicas, Carlos Moedas era visto pela família Espírito Santo como um «facilitador». «Vamos pôr o Moedas a funcionar», chegou a dizer José Manuel Espírito Santo.
Moedas não se revê neste rótulo, escreve que não facilitou nem ajudou e não tomou medidas. E acrescenta que nem tinha de tomar. A área dele no Governo não incluía o setor bancário.