Nomeação de Centeno é "gravíssima" e revela que independência do BCE não é levada "a sério"
A representante da associação cívica Transparência e Integridade afirma que António Costa "continua a não compreender qual deve ser o seu papel nesta fase para com o país".
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A presidente da associação cívica Transparência e Integridade considera "gravíssimo" que António Costa tenha proposto que o atual governador do Banco de Portugal (BdP) e antigo ministro das Finanças fosse o seu sucessor na liderança do Executivo. Para Margarida Mano, isto confirma que a independência do Banco Central Europeu (BCE) não é levada "a sério".
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Margarida Mano critica a posição do primeiro-ministro demissionário e até do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
"Se Mário Centeno foi convidado pelo primeiro-ministro com o Presidente da República a concordar é gravíssimo. Do ponto de vista ético, o Presidente da República não esteve bem, o primeiro-ministro não esteve bem, aliás, é revelador que continua a não compreender o que é que se passou e qual deve ser o seu papel nesta fase para com o país, porque depois da demissão, nas condições em que foi, o país dispensa ter o primeiro-ministro a atuar", aponta a líder da associação, que acrescenta que os portugueses só quererão ouvir António Costa se este quiser "falar das razões que estão na base da contratação do seu chefe de gabinete detido, dos ministros envolvidos em sucessivos casos e também constituídos arguidos e da contração do melhor amigo".
Margarida Mano não entende também como é que Mário Centeno terá aceitado ser primeiro-ministro até às eleições, sublinhando que esta questão já tinha sido levantada na altura em que o atual governador "transitou diretamente do Governo para o BdP".
"Agora foi a confirmação de que Mário Centeno, o Governo, e não sei se o Presidente da República sabia, não levam a sério a independência do Banco Central. Isso é grave. Muito grave do ponto de vista da incompetência de quem tem a responsabilidade de estar a governar e é muito grave do ponto de vista ético", destaca.
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A presidente da Associação Transparência e Integridade reforça, por isso, que estas três personalidades "deveriam conhecer muito bem a questão da ilegalidade dessa situação".
"É uma questão de legalidade quer em termos de direito europeu, há um parâmetro constitucional do direito europeu que impõe a independência entre o sistema europeu de bancos centrais e os governos, e também em termos do direito português, porque há uma imposição constitucional nossa", explica.
A responsável espera agora que a Comissão de Ética do BdP apure o que aconteceu e tome medidas.
A conduta de Mário Centeno vai ser avaliada , após o nome do antigo ministro das Finanças ter sido proposto para primeiro-ministro, na sequência da crise política que levou à demissão de António Costa. A comissão, liderada por Rui Vilar, pretende analisar um eventual conflito de interesses ou incompatibilidade neste caso já esta segunda-feira.
António Costa anunciou na terça-feira a sua demissão do cargo de primeiro-ministro.
Portugal vai ter eleições legislativas antecipadas em 10 de março de 2024, marcadas pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
António Costa é alvo de uma investigação do Ministério Público no Supremo Tribunal de Justiça, após suspeitos num processo relacionado com negócios sobre o lítio, o hidrogénio verde e um centro de dados em Sines terem invocado o seu nome como tendo intervindo para desbloquear procedimentos.
O Ministério Público (MP) considera que houve intervenção do primeiro-ministro na aprovação de um diploma favorável aos interesses da empresa Start Campus, responsável pelo centro de dados, de acordo com a indiciação, que contém várias outras referências a António Costa.
No dia da demissão, Costa recusou a prática "de qualquer ato ilícito ou censurável".
De acordo com o MP, no processo dos negócios do lítio, hidrogénio verde e do centro de dados em Sines podem estar em causa os crimes de prevaricação, corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e tráfico de influência.