Joana Marques Vidal foi uma das convidadas desta tarde da Emissão Especial da TSF, em direto do Cinema São Jorge.
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A antiga Procuradora-Geral da República Joana Marques Vidal, foi uma das entrevistadas da Emissão Especial da TSF, que decorreu esta tarde no Cinema São Jorge. A criminalidade económico-financeira e a corrupção foram um dos temas principais desta conversa entre o jornalista Manuel Acácio com Joana Marques Vidal, PGR entre entre 2013 e 2018.
Questionada sobre se o poder político está empenhado no combate a este tipo de crime, Joana Marques Vidal relembrou que, tal como já disse outras vezes, "há uma preocupação - claro - como tem sido assumido pelos diversos titulares dos cargos políticos."
No entanto, defende a antiga procuradora, "não há, em Portugal, uma estratégia nacional de combate à corrupção. Quando se fala numa estratégia nacional, passa por várias áreas, não é só centrar essa estratégia no funcionamento do poder judicial. Que, já agora, tem obviamente falta de recursos, meios e conhecimentos para combater a corrupção como deve ser", atira.
"É essencial haver uma cultura cívica de cidadania, que diga não de uma maneira interiorizada, à corrupção. Isso passa por uma maior transparência, por não considerar normal que se dê conhecimento a amigos de cadernos de encargos - isto acontece, infelizmente, em muitos sítios em Portugal. Há uma normalização de um determinado tipo de comportamentos e práticas que vão contra a transparência e que põem em causa o funcionamento do Estado de direito", critica a ex-procuradora.
Face a estes problemas, Joana Marques Vidal defende que é necessário "haver uma cultura de dizer 'não'. Passa, obviamente, pelos próprios cidadãos, mas passa também pela atitude dos poderes públicos face a esse problema. Já agora, peço desculpa, mas perguntam-me: a corrupção é o crime mais grave em Portugal? Há crimes que atingem os valores pessoais, muito mais graves. O tráfico de seres humanos é muito mais grave. O abuso sexual é muito mais grave. Mas a corrupção tem a gravidade de ser o crime que corrói o Estado de direito democrático", relembra.
"A corrupção corrói, é essencial para o estado de Direito a luta contra a corrupção", concluiu a antiga procuradora.
Nesta conversa, inserida nas comemorações do 31.º aniversário da TSF, Joana Marques Vidal abordou também o processo que culminou na queda do Banco Espírito Santo.
"Não é só este caso que nos deve fazer retirar lições. São os vários casos que, ao longo dos últimos anos, a Justiça foi tendo que tratar", começou por notar a antiga procuradora em relação ao processo que culminou no final do BES. Joana Marques Vidal faz notar que estas não são lições em relação "apenas ao funcionamento sistema judicial", mas sim "ao modo como toda a sociedade se organiza, ao modo como encara - em termos económicos, culturais e sociais - a organização do seu regime democrático e também do seu sistema financeiro."
A Justiça tem enfrentado novos desafios, tanto "pela complexidade dos casos que vão surgindo", como também pela "inserção mundial - a globalização - e interdependência das 'justiças' a nível europeu e mundial." Esta cooperação entre justiças representa um desafio porque, aos olhos de Joana Marques Vidal, obriga a Justiça "a ter em atenção a cooperação" com as outras justiças e a dimensão das questões, que já não são só "portuguesas."
Além destes fatores, a antiga procuradora-geral da República lembra que a Justiça "é para o cidadão" e que deve ser "acessível, deve conseguir comunicar e deve ser percetível para o cidadão."
Com base nestes fatores, Joana Marques Vidal identifica dois grandes desafios para a Justiça: "conseguir manter e alcançar o equilíbrio entre a defesa acérrima do modelo de direitos humanos face à defesa da segurança e eficácia" e também o de "ter a coragem de encarar a Justiça como um órgão de poder nas sociedades democráticas, mantendo o reforço da separação de poderes - sem esquecer a interdependência - considerando que esse é um ponto essencial da democracia e do Estado de direito."
Questionada por Manuel Acácio sobre as formas como a Justiça pode prevalecer, Joana Marques Vidal lembra que a Justiça deve ser "ágil e suficientemente atualizada e modernizada" para conseguir enfrentar os desafios que enumerou e que são "europeus e mundiais".
"Há um grande risco na Europa", alerta. "Estamos a assistir a grandes violações da independência dos tribunais e da autonomia do Ministério Público" em países europeus, com países de "caráter autoritário" a colocá-los em causa. "Põe em causa a democracia e aquilo que defendemos como valores essenciais do Estado de direito", alerta.
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